sexta-feira, 4 de junho de 2010

Atividades

Texto para as questões de 1 a 4

1 A despeito da retórica que chama atenção para avanços obtidos pelo país no plano econômico, é mais do que evidente que o Brasil ainda se enquadra no elenco dos 4 chamados países em desenvolvimento, com índices verdadeiramente escandalosos em termos de qualidade de vida, saúde e educação, com significativa parcela da população 7 alijada do que os estudiosos costumam designar como mínimo existencial para uma vida digna.
Ressalte-se que a doutrina diverge quando se trata de 10 estabelecer a acepção do termo democracia. Apesar das divergências acerca de conceitos, teses ou doutrinas, há consenso de que a democracia constitui a melhor forma de 13 governo de um Estado, visto que impede atos de violência e de intolerância, buscando a integração e a inclusão. Cumpre acrescentar que, no enfrentamento do desafio de inclusão 16 social, emerge cristalina a necessidade de fortalecer as instituições democráticas. Nessa linha de pensamento em que se procura reverter 19 um processo de descrença, a defensoria pública, erigida na Constituição Federal de 1988 (CF) à condição de instituição essencial à justiça, precisa preencher relevante espaço no 22 compromisso constitucional de redução das desigualdades, com promoção do integral acesso à justiça. Assim definida, cabe-lhe não só a assistência judiciária, pois pouco, ou nada, valem
25 direitos formalmente reconhecidos, sem que se concretizem na vida das pessoas e dos grupos sociais. Aquilo de que se precisa, de uma vez por todas, compreende igualmente um conjunto de 28 atividades extrajudiciais e de informação, extremamente imprescindível em um país de analfabetos e semianalfabetos, com o intuito de proporcionar aos necessitados consciência de 31 seus direitos, fazendo-os se verem como partes integrantes desse país, ou seja, como cidadãos.
Tatiana de Carvalho Camilher. O papel da defensoria pública para a inclusão social rumo à concretização do estado democrático de direito. Internet: (com adaptações).

QUESTÃO 1
Com base nas informações apresentadas no texto, assinale a opção correta.
A Constitui o escopo da defensoria pública o acesso integral à justiça, o que se traduz na elevação do indivíduo analfabeto e semianalfabeto à condição de cidadão.
B Como em todos os países em desenvolvimento, a população brasileira não tem acesso à informação.
C Regimes democráticos de governo estorvam condutas denotadoras de coação e de preconceito.
D No Brasil, a CF é elemento garantidor suficiente para asseverar o tratamento igualitário dos cidadãos pelo Estado.
E O Brasil não constitui, de fato, um governo de Estado democrático, uma vez que necessita de ações promotoras da redução do índice de desigualdades sociais.

QUESTÃO 2
Considerando que as opções a seguir apresentam propostas de reescrita dos trechos do texto indicados entre aspas, assinale a opção que, além de estar gramaticalmente correta, mantém o
sentido original do texto.
A “Cumpre acrescentar (...) instituições democráticas” (R.14-17):
Convém acrescentar que se evidencia claramente a imprescindibilidade de aprimoramento das instituições democráticas no confronto com a difícil busca da inclusão social.
B “A despeito (...) em desenvolvimento” (R.1-4): Em face à exaltação dos avanços econômicos do Brasil, este é ainda um país em desenvolvimento.
C “com significativa (...) vida digna” (R.6-8): mais de 50% da população brasileira nunca teve acesso a bons índices de qualidade de vida, saúde e educação, o que equivale a dizer que nunca fizeram jus a uma vida digna.
D “Ressalte-se (...) termo democracia” (R.9-10): Destaque-se a divergência doutrinária no que pertine ao conceito de democracia.
E “Apesar das (...) de governo” (R.10-13): O regime democrático de governo sempre foi considerado o mais adequado, não obstante as disparidades conceituais, doutrinárias e de teses.

QUESTÃO 3
A respeito de aspectos sintáticos do texto, assinale a opção correta.
A A forma verbal “compreende” (R.27) concorda com o respectivo sujeito: “um conjunto de atividades extrajudiciais e de informação” (R.27-28).
B Na linha 16, o deslocamento do vocábulo “cristalina” para imediatamente depois de “necessidade” não interfere no sentido nem na estrutura sintática do trecho.
C Na linha 18, o vocábulo “que” retoma “linha de pensamento” e pode, juntamente com a preposição que o antecede e sem prejuízo gramatical ou de sentido para o texto, receber artigo
definido masculino e ser reescrito da seguinte forma: no qual.
D O pronome “lhe” (R.23) faz referência a “defensoria pública” (R.19).
E O termo “direitos formalmente reconhecidos” (R.25) exerce função de complemento de ambas as formas verbais “valem” (R.24) e “concretizem” (R.25).

QUESTÃO 4
Quanto à pontuação empregada no texto, assinale a opção correta.
A As vírgulas que isolam o segmento “ou nada” (R.24) são obrigatórias.
B O emprego de vírgula logo após o vocábulo “Brasil” (R.3) manteria a correção gramatical do texto.
C Caso se desejasse intensificar a ênfase ao que se destaca no texto, seria correto empregar vírgula logo após o termo “Ressalte-se” (R.9).
D A vírgula empregada logo após o vocábulo “que” (R.15) é obrigatória.
E A supressão da vírgula logo após “pública” (R.19) manteria a correção gramatical e o sentido original do texto.

Texto para as questões 5 e 6
1 O direito que se realiza pacificamente é o ideal — praticamente inatingível — de uma sociedade que se queira justa. Justiça, a seu turno, exige efetivação de direitos 4 humanos, configuração da verdadeira cidadania, a qual abrange, obrigatoriamente, direitos civis, sociais e políticos; adoção de políticas públicas amplas e eficazes. Justiça não é 7 simplesmente acesso ao Poder Judiciário, o qual, por mais estruturado e eficiente que seja, não a promove sozinho. Não se pode exercer, pacífica ou contenciosamente, 10 um direito de que não se sabe titular. E a grande maioria da população brasileira não exerce seus direitos simplesmente porque os desconhece — o que é mais grave —, em uma 13 ignorância hábil para provocar grande parte das mazelas sociais que lotam os jornais brasileiros contemporâneos. Dizimar tal ignorância é papel essencial da defensoria pública.
Amélia Soares da Rocha. Defensoria pública e igualdade material no acesso à justiça. Internet: (com adaptações).

QUESTÃO 5
Com relação às ideias e à estrutura do texto, assinale a opção correta.
A De acordo com o texto, a parcela da população brasileira que não exerce seus direitos não tem acesso à defensoria pública.
B De acordo com o texto, justiça e Poder Judiciário são matérias complementares.
C O texto é imparcial com relação ao tema tratado, limitando-se a descrever os conceitos de direito e justiça; é, por isso, essencialmente descritivo.
D O texto, por defender uma tese — a de que a cidadania só pode ser exercida de forma plena quando os indivíduos têm conhecimento de seus direitos e deveres —, é predominantemente dissertativo-argumentativo.
E Não exercer os direitos que se tem por desconhecê-los é bastante grave, segundo o texto, porque esse é um caso muito difícil de ser resolvido.

QUESTÃO 6
Com relação ao vocabulário e à estrutura gramatical do texto, assinale a opção correta.
A O vocábulo desigualdades pode substituir “mazelas” (R.13) no texto, mantendo seu sentido original e sua correção gramatical.
B Na linha 1, a palavra “ideal” é um adjetivo que caracteriza “direito”.
C Na linha 7, a expressão “o qual” retoma “acesso ao Poder Judiciário”.
D O pronome “a” em “não a promove sozinho” (R.8) retoma a expressão “verdadeira cidadania” (R.4).
E O trecho “pacífica ou contenciosamente” (R.9) apresenta ideias opostas.

Texto para as questões de 7 a 9
1 A ideia de democracia tem seu nascedouro nas cidades-Estados gregas e consubstancia-se na tomada de decisões mediante a participação direta dos cidadãos. Como se 4 pode depreender, o conceito era restrito, pois excluía, por exemplo, as mulheres e os escravos. Na trajetória da Grécia, com sua experiência de democracia primária ou de assembleia, 7 ao mundo moderno, alguns fatores se apresentaram como inviabilizadores da participação política direta: número de cidadãos, extensão territorial e tempo (noção cada vez mais 10 modificada diante dos avanços tecnológicos). Diante da impossibilidade de reunião de todos os envolvidos — aqueles que, de alguma forma, sentem os 13 reflexos das decisões tomadas — e sendo cada vez mais
urgente a tomada de decisões em tempo recorde, identificou-se a necessidade de eleger representantes. Assim nasceu a 16 democracia representativa, com seus prós e contras. A rigor, em uma sociedade composta de milhares de pessoas, apenas mediante a representação por um grupo 19 escolhido é possível que os diferentes interesses se façam presentes no momento de decidir; porém, é certo que nem sempre esse grupo representa os interesses do todo e nem
22 sempre todos os interesses de uma sociedade plural chegam a ter representantes, ficando alguns alijados do processo decisório. Um governo que se propõe como democrático busca 25 estabelecer mecanismos para que sejam garantidas ao máximo as possibilidades de os cidadãos participarem das decisões políticas, mas há um “lado sombrio”, identificado por Robert 28 Dahl nos seguintes termos: “sob um governo representativo, muitas vezes os cidadãos delegam imensa autoridade arbitrária para decisões de importância extraordinária.”. Segundo o autor, 31 as eleições periódicas garantem certo compromisso dos representantes com os representados, obrigam as elites a “manter um olho na opinião do povo”. Apesar do “lado
34 sombrio”, a democracia alicerçada sobre o pilar da eleição periódica de representantes é a única viável nos Estados contemporâneos.
Tatiana de Carvalho Camilher. O papel da defensoria pública para a inclusão social rumo à concretização do estado democrático de direito. Internet: (com adaptações).

QUESTÃO 7
Assinale a opção correta de acordo com as ideias apresentadas no texto.
A Da argumentação do texto, conclui-se que a realização de eleições periódicas garante que os representantes escolhidos cumpram os compromissos assumidos com os seus representados.
B Nos dias de hoje, fatores como contingente populacional e extensão territorial não obstam a participação direta dos cidadãos nas decisões governamentais.
C A democracia representativa derivou da negligência de certos grupos da sociedade nas decisões do Estado.
D A escolha de representantes no sistema de governo democrático garante o atendimento às necessidades de toda a população.
E O “lado sombrio” (R.27) do governo democrático é assim denominado porque, nesse regime, os interesses dos cidadãos
podem estar sob a responsabilidade de indivíduos detentores de poder excepcional.

QUESTÃO 8
Com relação à estrutura do texto e ao vocabulário nele empregado, assinale a opção correta.
A A substituição de “sobre” (R.34) por sob alteraria o sentido original do texto, mas manteria sua coerência e sua correção gramatical.
B O trecho entre travessões nas linhas 12 e 13 explica a expressão “todos os envolvidos” (R.11-12).
C O vocábulo “recorde” (R.14) também poderia ser corretamente grafado com acento — récorde.
D A substituição de “composta de” (R.17) por constituída de acarretaria prejuízo de sentido ao texto.
E A palavra indivíduos está implícita logo após o vocábulo “alguns” no trecho “ficando alguns alijados do processo decisório” (R.23-24).

QUESTÃO 9
Considerando as estruturas do texto, assinale a opção correta no que diz respeito à concordância.
A A inserção da forma verbal manterem no lugar de “manter”, em “manter um olho na opinião do povo” (R.33), acarretaria prejuízo sintático ao texto.
B A oração existia alguns fatores inviabilizadores parafraseia de modo gramaticalmente correto o trecho “alguns fatores se apresentaram como inviabilizadores” (R.7-8).
C Ainda que o vocábulo “necessidade” (R.15) estivesse flexionado no plural, a forma verbal “identificou” (R.14) deveria permanecer no singular.
D A alteração de “sejam garantidas” (R.25) para seja garantido não interfere na correção gramatical do período.
E As formas verbais “garantem” (R.31) e “obrigam” (R.32) concordam com “eleições periódicas” (R.31).

QUESTÃO 10
Considerando as normas de redação oficial, assinale a opção correta.
A O uso do padrão culto da língua deve ser evitado nas redações oficiais, pois dificulta o entendimento dos textos por parte da população em geral.
B A redação de um documento oficial deve visar primordialmente o entendimento da mensagem pelo seu remetente, para quem, de fato, ela é importante.
C O registro de impressões pessoais nas comunicações oficiais não deve ocorrer, ainda que o expediente apresente signatário e destinatário identificados nominalmente.
D Como forma de uniformizar as comunicações oficiais, emprega-se o mesmo vocativo em todas elas, independentemente de seu destinatário.
E Todos os expedientes oficiais devem seguir a mesma diagramação.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

O conto da ilha desconhecida

O conto da ilha desconhecida

José Saramago


Um homem foi bater à porta do rei e disse-lhe, Dá-me um barco. A casa do rei tinha muitas mais portas, mas aquela era a das petições. Como o rei passava todo o tempo sentado à porta dos obséquios (entenda-se, os obséquios que lhe faziam a ele), de cada vez que ouvia alguém a chamar à porta das petições fingia-se desentendido, e só quando o ressoar contínuo da aldraba de bronze se tornava, mais do que notório, escandaloso, tirando o sossego à vizinhança (as pessoas começavam a murmurar, Que rei temos nós, que não atende), é que dava ordem ao primeiro-secretário para ir saber o que queria o impetrante, que não havia maneira de se calar. Então, o primeiro-secretário chamava o segundo-secretário, este chamava o terceiro, que mandava o primeiro-ajudante, que por sua vez mandava o segundo, e assim por aí fora até chegar à mulher da limpeza, a qual, não tendo ninguém em quem mandar, entreabria a porta das petições e perguntava pela frincha, Que é que tu queres. O suplicante dizia ao que vinha, isto é, pedia o que tinha a pedir, depois instalava-se a um canto da porta, à espera de que o requerimento fizesse, de um em um, o caminho ao contrário, até chegar ao rei. Ocupado como sempre estava com os obséquios, o rei demorava a resposta, e já não era pequeno sinal de atenção ao bem-estar e felicidade do seu povo quando resolvia pedir um parecer fundamentado por escrito ao primeiro-secretário, o qual, escusado se ria dizer, passava a encomenda ao segundo-secretário, este ao terceiro, sucessivamente, até chegar outra vez à mulher da limpeza, que despachava sim ou não conforme estivesse de maré.

Contudo, no caso do homem que queria um barco, as coisas não se passaram bem assim. Quando a mulher da limpeza lhe perguntou pela nesga da porta, Que é que tu queres, o homem, em lugar de pedir, como era o costume de todos, um título, uma condecoração, ou simplesmente dinheiro, respondeu, Quero falar ao rei, Já sabes que o rei não pode vir, está na porta dos obséquios, respondeu a mulher, Pois então vai lá dizer-lhe que não saio daqui até que ele venha, pessoalmente, saber o que quero, rematou o homem, e deitou-se ao comprido no limiar, tapando-se com a manta por causa do frio. Entrar e sair, só por cima dele. Ora, isto era um enorme problema, se tivermos em consideração que, de acordo com a pragmática das portas, ali só se podia atender um suplicante de cada vez, donde resultava que, enquanto houvesse alguém à espera de resposta, nenhuma outra pessoa se poderia aproximar a fim de expor as suas necessidades ou as suas ambições. À primeira vista, quem ficava a ganhar com este artigo do regulamento era o rei, dado que, sendo menos numerosa a gente que o vinha incomodar com lamúrias, mais tempo ele passava a ter, e mais descanso, para receber, contemplar e guardar os obséquios. À segunda vista, porém, o rei perdia, e muito, porque os protestos públicos, ao notar-se que a resposta estava a tardar mais do que o justo, faziam aumentar gravemente o descontentamento social, o que, por seu turno, ia ter imediatas e negativas consequências no afluxo de obséquios. No caso que estamos narrando, o resultado da ponderação entre os benefícios e os prejuízos foi ter ido o rei, ao cabo de três dias, e em real pessoa, à porta das petições, para saber o que queria o intrometido que se havia negado a encaminhar o requerimento pelas competentes vias burocráticas. Abre a porta, disse o rei à mulher da limpeza, e ela perguntou, Toda, ou só um bocadinho. O rei duvidou por um instante, na verdade não gostava muito de se expor aos ares da rua, mas depois reflexionou que pareceria mal, além de ser indigno da sua majestade, falar com um súdito através de uma nesga, como se tivesse medo dele, mormente estando a assistir ao colóquio a mulher da limpeza, que logo iria dizer por aí sabe Deus o quê, De par em par, ordenou. O homem que queria um barco levantou-se do degrau da porta quando começou a ouvir correr os ferrolhos, enrolou a manta e pôs-se à espera. Estes sinais de que finalmente alguém vinha atender, e que portanto a praça não tardaria a ficar desocupada, fizeram aproximar-se da porta uns quantos aspirantes à liberalidade do trono que por ali andavam, prontos a assaltar o lugar mal ele vagasse. O inopinado aparecimento do rei (nunca uma tal coisa havia sucedido desde que ele andava de coroa na cabeça) causou uma surpresa desmedida, não só aos ditos candidatos mas também à vizinhança que, atraída pelo repentino alvoroço, assomara às janelas das casas, no outro lado da rua. A única pessoa que não se surpreendeu por aí além foi o homem que tinha vindo pedir um barco. Calculara ele, e acertara na previsão, que o rei, mesmo que demorasse três dias, haveria de sentir-se curioso de ver a cara de quem, sem mais nem menos, com notável atrevimento, o mandara chamar. Repartido pois entre a curiosidade que não pudera reprimir e o desagrado de ver tanta gente junta, o rei, com o pior dos modos, perguntou três perguntas seguidas, Que é que queres, Por que foi que não disseste logo o que querias, Pensarás tu que eu não tenho mais nada que fazer, mas o homem só respondeu à primeira pergunta, Dá-me um barco, disse. O assombro deixou o rei a tal ponto desconcertado, que a mulher da limpeza se apressou a chegar-lhe uma cadeira de palhinha, a mesma em que ela própria se sentava quando precisava de trabalhar de linha e agulha, pois, além da limpeza, tinha também à sua responsabilidade alguns, trabalhos menores de costura no palácio como passajar as peúgas dos pajens. Mal sentado, porque a cadeira de palhinha era muito mais baixa que o trono, o rei estava a procurar a melhor maneira de acomodar as pernas, ora encolhendo-as ora estendendo-as para os lados, enquanto o homem que queria um barco esperava com paciência a pergunta que se seguiria, E tu para que queres um barco, pode-se saber, foi o que o rei de facto perguntou quando finalmente se deu por instalado, com sofrível comodidade, na cadeira da mulher da limpeza, Para ir à procura da ilha desconhecida, respondeu o homem, Que ilha desconhecida, perguntou o rei disfarçando o riso, como se tivesse na sua frente um louco varrido, dos que têm a mania das navegações, a quem não seria bom contrariar logo de entrada, A ilha desconhecida, repetiu o homem, Disparate, já não há ilhas desconhecidas, Quem foi que te disse, rei, que já não há ilhas desconhecidas, Estão todas nos mapas, Nos mapas só estão as ilhas conhecidas, E que ilha desconhecida é essa de que queres ir à procura, Se eu to pudesse dizer, então não seria desconhecida, A quem ouviste tu falar dela, perguntou o rei, agora mais sério, A ninguém, Nesse caso, por que teimas em dizer que ela existe, Simplesmente porque é impossível que não exista uma ilha desconhecida, E vieste aqui para me pedires um barco, Sim, vim aqui para pedir-te um barco, E tu quem és, para que eu to dê, E tu quem és, para que não mo dês, Sou o rei deste reino, e os barcos do reino pertencem-me todos, Mais lhes pertencerás tu a eles do que eles a ti, Que queres dizer, perguntou o rei, inquieto, Que tu, sem eles, és nada, e que eles, sem ti, poderão sempre navegar, Às minhas ordens, com os meus pilotos e os meus marinheiros, Não te peço marinheiros nem piloto, só te peço um barco, E essa ilha desconhecida, se a encontrares, será para mim, A ti, rei, só te interessam as ilhas conhecidas, Também me interessam as desconhecidas quando deixam de o ser, Talvez esta não se deixe conhecer, Então não te dou o barco, Darás. Ao ouvirem esta palavra, pronunciada com tranquila firmeza, os aspirantes à porta das petições, em quem, minuto após minuto, desde o princípio da conversa, a impaciência vinha crescendo, e mais para se verem livres dele do que por simpatia solidária, resolveram intervir a favor do homem que queria o barco, começando a gritar, Dá-lhe o barco, dá-lhe o barco. O rei abriu a boca para dizer à mulher da limpeza que chamasse a guarda do palácio a vir restabelecer imediatamente a ordem pública e impor a disciplina, mas, nesse momento, as vizinhas que assistiam das janelas juntaram-se ao coro com entusiasmo, gritando como os outros, Dá-lhe o barco, dá-lhe o barco. Perante uma tão iniludível manifestação da vontade popular e preocupado com o que, neste meio tempo, já haveria perdido na porta dos obséquios, o rei levantou a mão direita a impor silêncio e disse, Vou dar-te um barco, mas a tripulação terás de arranjá-la tu, os meus marinheiros são-me precisos para as ilhas conhecidas. Os gritos de aplauso do público não deixaram que se percebesse o agradecimento do homem que viera pedir um barco, aliás o movimento dos lábios tanto teria podido ser Obrigado, meu senhor, como Eu cá me arranjarei, mas o que distintamente se ouviu foi o dito seguinte do rei, Vais à doca, perguntas lá pelo capitão do porto, dizes-lhe que te mandei eu, e ele que te dê o barco, levas o meu cartão. O homem que ia receber um barco leu o cartão de visita, onde dizia Rei por baixo do nome do rei, e eram estas as palavras que ele havia escrito sobre o ombro da mulher da limpeza, Entrega ao portador um barco, não precisa ser grande, mas que navegue bem e seja seguro, não quero ter remorsos na consciência se as coisas lhe correrem mal. Quando o homem levantou a cabeça, supõe-se que desta vez é que iria agradecer a dádiva, já o rei se tinha retirado, só estava a mulher da limpeza a olhar para ele com cara de caso. O homem desceu do degrau da porta, sinal de que os outros candidatos podiam enfim avançar, nem valeria a pena explicar que a confusão foi indescritível, todos a quererem chegar ao sítio em primeiro lugar, mas com tão má sorte que a porta já estava fechada outra vez. A aldraba de bronze tornou a chamar a mulher da limpeza, mas a mulher da limpeza não está, deu a volta e saiu com o balde e a vassoura por outra porta, a das decisões, que é raro ser usada, mas quando o é, é. Agora sim, agora pode-se compreender o porquê da cara de caso com que a mulher da limpeza havia estado a olhar, foi esse o preciso momento em que ela resolveu ir atrás do homem quando ele se dirigisse ao porto a tomar conta do barco. Pensou ela que já bastava de uma vida a limpar e a lavar palácios, que tinha chegado a hora de mudar de ofício, que lavar e limpar barcos é que era a sua vocação verdadeira, no mar, ao menos, a água nunca lhe faltaria. O homem nem sonha que, não tendo ainda sequer começado a recrutar os tripulantes, já leva atrás de si a futura encarregada das baldeações e outros asseios, também é deste modo que o destino costuma comportar-se connosco, já está mesmo atrás de nós, já estendeu a mão para tocar-nos o ombro, e nós ainda vamos a murmurar, Acabou-se, não há mais que ver, é tudo igual.

Andando, andando, o homem chegou ao porto, foi à doca, perguntou pelo capitão, e enquanto ele não chegava deitou-se a adivinhar qual seria, de quantos barcos ali estavam, o que iria ser o seu, grande já se sabia que não, o cartão de visita do rei era muito claro neste ponto, por conseguinte ficavam de fora os paquetes, os cargueiros e os navios de guerra, tão-pouco poderia ser ele tão pequeno que resistisse mal às forças do vento e aos rigores do mar, o rei também havia sido categórico neste ponto, Que navegue bem e seja seguro, foram estas as suas formais palavras, assim implicitamente excluindo os botes, as faluas e os escaleres, os quais, sendo bons navegantes, e seguros, conforme a condição de cada qual, não tinham nascido para sulcar os oceanos, que é onde se encontram as ilhas desconhecidas. Um pouco afastada dali, escondida por trás de uns bidões, a mulher da limpeza correu os olhos pelos barcos atracados, Para o meu gosto, aquele, pensou, porém a sua opinião não contava, nem sequer havia sido ainda contratada, vamos ouvir antes o que dirá o capitão do porto. O capitão veio, leu o cartão, mirou o homem de alto a baixo, e fez a pergunta que o rei se tinha esquecido de fazer, Sabes navegar, tens carta de navegação, ao que o homem respondeu, Aprenderei no mar. O capitão disse, Não to aconselharia, capitão sou eu, e não me atrevo com qualquer barco, Dá-me então um com que possa atrever-me eu, não, um desses não, dá-me antes um barco que eu respeite e que possa respeitar-me a mim, Essa linguagem é de marinheiro, mas tu não és marinheiro, Se tenho a linguagem, é como se o fosse. O capitão tornou a ler o cartão do rei, depois perguntou, Poderás dizer-me para que queres o barco, Para ir à procura da ilha desconhecida, Já não há ilhas desconhecidas, O mesmo me disse o rei, O que ele sabe de ilhas, aprendeu-o comigo, É estranho que tu, sendo homem do mar, me digas isso, que já não há ilhas desconhecidas, homem da terra sou eu, e não ignoro que todas as ilhas, mesmo as conhecidas, são desconhecidas enquanto não desembarcarmos nelas, Mas tu, se bem entendi, vais à procura de uma onde nunca ninguém tenha desembarcado, Sabê-lo-ei quando lá chegar, Se chegares, Sim, às vezes naufraga-se pelo caminho, mas, se tal me viesse a acontecer, deverias escrever nos anais do porto que o ponto a que cheguei foi esse, Queres dizer que chegar, sempre se chega, Não serias quem és se não o soubesses já. O capitão do porto disse, Vou dar-te a embarcação que te convém, Qual é ela, É um barco com muita experiência, ainda do tempo em que toda a gente andava à procura de ilhas desconhecidas, Qual é ele, Julgo até que encontrou algumas, Qual, Aquele. Assim que a mulher da limpeza percebeu para onde o capitão apontava, saiu a correr de detrás dos bidões e gritou, É o meu barco, é o meu barco, há que perdoar-lhe a insólita reivindicação de propriedade, a todos os títulos abusiva, o barco era aquele de que ela tinha gostado, simplesmente. Parece uma caravela, disse o homem, Mais ou menos, concordou o capitão, no princípio era uma caravela, depois passou por arranjos e adaptações que a modificaram um bocado, Mas continua a ser uma caravela, Sim, no conjunto conserva o antigo ar, E tem mastros e velas, Quando se vai procurar ilhas desconhecidas, é o mais recomendável. A mulher da limpeza não se conteve, Para mim não quero outro, Quem és tu, perguntou o homem, Não te lembras de mim, Não tenho idéia, Sou a mulher da limpeza, Qual limpeza, A do palácio do rei, A que abria a porta das petições, Não havia outra, E por que não estás tu no palácio do rei a limpar e a abrir portas, Porque as portas que eu realmente queria já foram abertas e porque de hoje em diante só limparei barcos, Então estás decidida a ir comigo procurar a ilha desconhecida, Saí do palácio pela porta das decisões, Sendo assim, vai para a caravela, vê como está aquilo, depois do tempo que passou deve precisar de uma boa lavagem, e tem cuidado com as gaivotas, que não são de fiar, Não queres vir comigo conhecer o teu barco por dentro, Tu disseste que era teu, Desculpa, foi só porque gostei dele, Gostar é provavelmente a melhor maneira de ter, ter deve ser a pior maneira de gostar. O capitão do porto interrompeu a conversa, Tenho de entregar as chaves ao dono do barco, a um ou a outro, resolvam-se, a mim tanto se me dá, Os barcos têm chave, perguntou o homem, Para entrar, não, mas lá estão as arrecadações e os paióis, e a escrivaninha do comandante com o diário de bordo, Ela que se encarregue de tudo, eu vou recrutar a tripulação, disse o homem, e afastou-se.

A mulher da limpeza foi ao escritório do capitão para recolher as chaves, depois entrou no barco, duas coisas lhe valeram aí, a vassoura do palácio e a prevenção contra as gaivotas, ainda não tinha acabado de atravessar a prancha que ligava a amurada ao cais e já as malvadas estavam a precipitar-se sobre ela aos guinchos, furiosas, de goela aberta, como se ali mesmo a quisessem devorar. Não sabiam com quem se metiam. A mulher da limpeza pousou o balde, meteu as chaves no seio, firmou bem os pés na prancha, e, redemoinhando a vassoura como se fosse um espadão dos tempos antigos, fez debandar o bando assassino. Foi só quando entrou no barco que compreendeu a ira das gaivotas, havia ninhos por toda a parte, muitos deles abandonados, outros ainda com ovos, e uns poucos com gaivotinhos de bico aberto, à espera da comida, Pois sim, mas o melhor é mudarem-se daqui, um barco que vai procurar a ilha desconhecida não pode ter este aspecto, como se fosse um galinheiro, disse. Atirou para a água os ninhos vazios, quanto aos outros deixou-os ficar, até ver. Depois arregaçou as mangas e pôs-se a lavar a coberta. Quando acabou a dura tarefa, foi abrir o paiol das velas e procedeu a um exame minucioso do estado das costuras, depois de tanto tempo sem irem ao mar e sem terem de suportar os esticões saudáveis do vento. As velas são os músculos do barco, basta ver como incham quando se esforçam, mas, e isso mesmo sucede aos músculos, se não se lhes dá uso regularmente, abrandam, amolecem, perdem nervo, E as costuras são como os nervos das velas, pensou a mulher da limpeza, contente por estar a aprender tão depressa a arte de marinharia. Achou esgarçadas algumas bainhas, mas contentou-se com assinalá-las, uma vez que para este trabalho não podiam servir a linha e a agulha com que passajava as peúgas dos pajens antigamente, quer dizer, ainda ontem. Quanto aos outros paióis, viu logo que estavam vazios. Que o da pólvora estivesse desmunido, salvo uns pozinhos negros no fundo, que primeiro mais lhe pareceram caganitas de rato, não lhe importou nada, de facto não está escrito em nenhuma lei, pelo menos até onde a sabedoria duma mulher da limpeza é capaz de alcançar, que ir em busca duma ilha desconhecida tenha de ser forçosamente uma empresa de guerra. Já a ralou, e muito, a falta absoluta de munições de boca no paiol respectivo, não por si própria, que estava mais do que acostumada ao mau passadio do palácio, mas por causa do homem a quem deram este barco, não tarda que o sol se ponha, e ele a aparecer-me aí a clamar que tem fome, que é o dito de todos os homens mal entram em casa, como se só eles é que tivessem estômago e sofressem da necessidade de o encher, E se já traz marinheiros para a tripulação, que são uns ogres a comer, então é que não sei como nos iremos governar, disse a mulher da limpeza.

Não valia a pena ter-se preocupado tanto. O sol havia acabado de sumir-se no oceano quando o homem que tinha um barco surgiu no extremo do cais. Trazia um embrulho na mão, porém vinha sozinho e cabisbaixo. A mulher da limpeza foi esperá-lo à prancha, mas antes que ela abrisse a boca para se inteirar de como lhe tinha corrido o resto do dia, ele disse, Está descansada, trago aqui comida para os dois, E os marinheiros, perguntou ela, Não veio nenhum, como podes ver, Mas deixaste-os apalavrados, ao menos, tornou ela a perguntar, Disseram-me que já não há ilhas desconhecidas, e que, mesmo que as houvesse, não iriam eles tirar-se do sossego dos seus lares e da boa vida dos barcos de carreira para se meterem em aventuras oceânicas, à procura de um impossível, como se ainda estivéssemos no tempo do mar tenebroso, E tu, que lhes respondeste, Que o mar é sempre tenebroso, E não lhes falaste da ilha desconhecida, Como poderia falar-lhes eu duma ilha desconhecida, se não a conheço, Mas tens a certeza de que ela existe, Tanta como a de ser tenebroso o mar, Neste momento, visto daqui, com aquela água cor de jade e o céu como um incêndio, de tenebroso não lhe encontro nada, É uma ilusão tua, também as ilhas às vezes parece que flutuam sobre as águas, e não é verdade, Que pensas fazer, se te falta a tripulação, Ainda não sei, Podíamos ficar a viver aqui, eu oferecia-me para lavar os barcos que vêm à doca, e tu, E eu, Tens com certeza um mester, um ofício, uma profissão, como agora se diz, Tenho, tive, terei se for preciso, mas quero encontrar a ilha desconhecida, quero saber quem sou eu quando nela estiver, Não o sabes, Se não sais de ti, não chegas a saber quem és, O filósofo do rei, quando não tinha que fazer, ia sentar-se ao pé de mim, a ver-me passajar as peúgas dos pajens, e às vezes dava-lhe para filosofar, dizia que todo o homem é uma ilha, eu, como aquilo não era comigo, visto que sou mulher, não lhe dava importância, tu que achas, Que é necessário sair da ilha para ver a ilha, que não nos vemos se não nos saímos de nós, Se não saímos de nós próprios, queres tu dizer, Não é a mesma coisa. O incêndio do céu ia esmorecendo, a água arroxeou-se de repente, agora nem a mulher da limpeza duvidaria de que o mar é mesmo tenebroso, pelo menos a certas horas. Disse o homem, Deixemos as filosofias para o filósofo do rei, que para isso é que lhe pagam, agora vamos nós comer, mas a mulher não esteve de acordo, Primeiro, tens de ver o teu barco, só o conheces por fora, Que tal o encontraste, Há algumas bainhas das velas que estão a precisar de reforço, Desceste ao porão, encontraste água aberta, No fundo vê-se alguma, de mistura com o lastro, mas isso parece que é próprio, faz bem ao barco, Como foi que aprendeste essas coisas, Assim, Assim como, Como tu, quando disseste ao capitão do porto que aprenderias a navegar no mar, Ainda não estamos no mar, Mas já estamos na água, Sempre tive a idéia de que para a navegação só há dois mestres verdadeiros, um que é o mar, o outro que é o barco, E o céu, estás a esquecer-te do céu, Sim, claro, o céu, Os ventos, As nuvens, O céu, Sim, o céu.

Em menos de um quarto de hora tinham acabado a volta pelo barco, uma caravela, mesmo transformada, não dá para grandes passeios. É bonita, disse o homem, mas se eu não conseguir arranjar tripulantes suficientes para a manobra, terei de ir dizer ao rei que já não a quero, Perdes o ânimo logo à primeira contrariedade, A primeira contrariedade foi estar à espera do rei três dias, e não desisti, Se não encontrares marinheiros que queiram vir, cá nos arranjaremos os dois, Estás doida, duas pessoas sozinhas não seriam capazes de governar um barco destes, eu teria de estar sempre ao leme, e tu, nem vale a pena estar a explicar-te, é uma loucura, Depois veremos, agora vamos mas é comer. Subiram para o castelo de popa, o homem ainda a protestar contra o que chamara loucura, e, ali, a mulher da limpeza abriu o farnel que ele tinha trazido, um pão, queijo duro, de cabra, azeitonas, uma garrafa de vinho. A lua já estava meio palmo sobre o mar, as sombras da verga e do mastro grande vieram deitar-se-lhes aos pés. É realmente bonita a nossa caravela, disse a mulher, e emendou logo, A tua, a tua caravela, Desconfio que não o será por muito tempo, Navegues ou não navegues com ela, é tua, deu-ta o rei, Pedi-lha para ir procurar uma ilha desconhecida, Mas estas coisas não se fazem do pé para a mão, levam o seu tempo, já o meu avô dizia que quem vai ao mar avia-se em terra, e mais não era ele marinheiro, Sem tripulantes não poderemos navegar, Já o tinhas dito, E há que abastecer o barco das mil coisas necessárias a uma viagem como esta, que não se sabe aonde nos levará, Evidentemente, e depois teremos de esperar que seja a boa estação, e sair com a boa maré, e vir gente ao cais a desejar-nos boa viagem, Estás a rir-te de mim, Nunca me riria de quem me fez sair pela porta das decisões, Desculpa-me, E não tornarei a passar por ela, suceda o que suceder. O luar iluminava em cheio a cara da mulher da limpeza, É bonita, realmente é bonita, pensou o homem, que desta vez não estava a referir-se à caravela. A mulher, essa, não pensou nada, devia ter pensado tudo durante aqueles três dias, quando entreabria de vez em quando a porta para ver se aquele ainda continuava lá fora, à espera. Não sobrou migalha de pão ou de queijo, nem gota de vinho, os caroços das azeitonas foram atirados para a água, o chão está tão limpo como ficara quando a mulher da limpeza lhe passou por cima o último esfregão. A sereia de um paquete que saía para o mar soltou um ronco potente, como deviam ter sido os do leviatã, e a mulher disse, Quando for a nossa vez faremos menos barulho. Apesar de estarem no interior da doca, a água ondulou um pouco à passagem do paquete, e o homem disse, Mas baloiçaremos muito mais. Riram os dois, depois ficaram calados, passado um bocado um deles opinou que o melhor seria irem dormir, Não é que eu tenha muito sono, e o outro concordou, Nem eu, depois calaram-se outra vez, a lua subiu e continuou a subir, em certa altura a mulher disse, Há beliches lá em baixo, o homem disse, Sim, e foi então que se levantaram, que desceram à coberta, aí a mulher disse, Até amanhã, eu vou para este lado, e o homem respondeu, E eu vou para este, até amanhã, não disseram bombordo nem estibordo, decerto por estarem ainda a praticar na arte. A mulher voltou atrás, Tinha-me esquecido, tirou do bolso do avental dois cotos de vela, Encontrei-os quando andava a limpar, o que não tenho é fósforos, Eu tenho, disse o homem. Ela segurou as velas, uma em cada mão, ele acendeu um fósforo, depois, abrigando a chama sob a cúpula dos dedos curvados, levou-a com todo o cuidado aos velhos pavios, a luz pegou, cresceu lentamente como faz o luar, banhou a cara da mulher da limpeza, nem seria preciso dizer o que ele pensou, É bonita, mas o que ela pensou, sim, Vê-se bem que só tem olhos para a ilha desconhecida, aqui está como as pessoas se enganam nos sentidos do olhar, sobretudo ao princípio. Ela entregou-lhe uma vela, disse, Até amanhã, dorme bem, ele quis dizer o mesmo doutra maneira, Que tenhas sonhos felizes, foi a frase que lhe saiu, daqui a pouco, quando lá estiver em baixo, deitado no seu beliche, vir-lhe-ão à ideia outras frases, mais espirituosas, sobretudo mais insinuantes, como se espera que sejam as de um homem quando está a sós com uma mulher. Perguntava-se se já dormiria, se teria tardado a entrar no sono, depois imaginou que andava à procura dela e não a encontrava em nenhum sítio, que estavam perdidos os dois num barco enorme, o sonho é um prestidigitador hábil, muda as proporções das coisas e as suas distâncias, separa ás pessoas, e elas estão juntas, reúne-as, e quase não se vêem uma à outra, a mulher dorme a poucos metros e ele não soube como alcançá-la, quando é tão fácil ir de bombordo a estibordo.

Tinha-lhe desejado felizes sonhos, mas foi ele quem levou toda a noite a sonhar. Sonhou que a sua caravela ia no mar alto, com as três velas triangulares gloriosamente enfunadas, abrindo caminho sobre as ondas, enquanto ele manejava a roda do leme e a tripulação descansava à sombra. Não percebia como podiam ali estar os marinheiros que no porto e na cidade se tinham recusado a embarcar com ele para ir à procura da ilha desconhecida, provavelmente arrependeram-se da grosseira ironia com que o haviam tratado. Via animais espalhados pela coberta, patos, coelhos, galinhas, o habitual da criação doméstica, debicando os grãos de milho ou roendo as folhas de couve que um marinheiro lhes atirava, não se lembrava de quando os tinha trazido para o barco, fosse como fosse era natural que ali estivessem, imaginemos que a ilha desconhecida é, como tantas vezes o foi no passado, uma ilha deserta, o melhor será jogar pelo seguro, todos sabemos que abrir a porta da coelheira e agarrar um coelho pelas orelhas sempre foi mais fácil do que persegui-lo por montes e vales. Do fundo do porão veio agora um coro de relinchos de cavalos, de mugidos de bois, de zurros de asnos, as vozes dos nobres animais necessários para o trabalho pesado, e como foi que vieram eles, como podem estar numa caravela onde a tripulação humana mal cabe, de súbito o vento deu uma guinada, a vela maior bateu e ondulou, por trás dela estava o que antes não se vira, um grupo de mulheres que mesmo sem as contar se adivinha serem tantas quantos os marinheiros, ocupam-se nas suas coisas de mulheres, ainda não chegou o tempo de se ocuparem doutras, está claro que isto só pode ser um sonho, na vida real nunca se viajou assim. O homem do leme buscou com os olhos a mulher da limpeza e não a viu, Talvez esteja no beliche de estibordo, a descansar da lavagem da coberta, pensou, mas foi um pensar fingido, porque ele bem sabe, embora também não saiba como o sabe, que ela à última hora não quis vir, que saltou para o cais, dizendo de lá, Adeus, adeus, já que só tens olhos para a ilha desconhecida, vou-me embora, e não era verdade, agora mesmo andam os olhos dele a procurá-la e não a encontram. Neste momento o céu cobriu-se e começou a chover, e, tendo chovido, principiaram a brotar inúmeras plantas das fileiras de sacos de terra alinhadas ao longo da amurada, não estão ali porque se suspeite que não haja terra bastante na ilha desconhecida, mas porque assim se ganhará tempo, no dia em que lá chegarmos só teremos que transplantar as árvores de fruto, semear os grãos das pequenas searas que vão amadurecer aqui, enfeitar os canteiros com as flores que desabrocharão destes botões. O homem do leme pergunta aos marinheiros que descansam na coberta se avistam alguma ilha desabitada, e eles respondem que não vêem nem de umas nem das outras, mas que estão a pensar em desembarcar na primeira terra povoada que lhes apareça, desde que haja lá um porto onde fundear, uma taberna onde beber e uma cama onde folgar, que aqui não se pode, com toda esta gente junta. E a ilha desconhecida, perguntou o homem do leme, A ilha desconhecida é coisa que não existe, não passa duma ideia da tua cabeça, os geógrafos do rei foram ver nos mapas e declararam que ilhas por conhecer é coisa que se acabou desde há muito tempo, Devíeis ter ficado na cidade, em lugar de vir atrapalhar-me a navegação, Andávamos à procura de um sítio melhor para viver e resolvemos aproveitar a tua viagem, Não sois marinheiros, Nunca o fomos, Sozinho, não serei capaz de governar o barco, Pensasses nisso antes de ir pedi-lo ao rei, o mar não ensina a navegar. Então o homem do leme viu uma terra ao longe e quis passar adiante, fazer de conta que ela era a miragem de uma outra terra, uma imagem que tivesse vindo do outro lado do mundo pelo espaço, mas os homens que nunca haviam sido marinheiros protestaram, disseram que ali mesmo é que queriam desembarcar, Esta é uma ilha do mapa, gritaram, matar-te-emos se não nos levares lá. Então, por si mesma, a caravela virou a proa em direcção à terra, entrou no porto e foi encostar à muralha da doca, Podeis ir-vos, disse o homem do leme, acto contínuo saíram em correnteza, primeiro as mulheres, depois os homens, mas não foram sozinhos, levaram com eles os patos, os coelhos e as galinhas, levaram os bois, os burros e os cavalos, e até as gaivotas, uma após outra, levantaram voo e se foram do barco transportando no bico os seus gaivotinhos, proeza que não tinha sido cometida antes, mas há sempre uma vez. O homem do leme assistiu à debandada em silêncio, não fez nada para reter os que o abandonavam, ao menos tinham-no deixado com as árvores, os trigos e as flores, com as trepadeiras que se enrolavam nos mastros e pendiam da amurada como festões. Por causa do atropelo da saída haviam-se rompido e derramado os sacos de terra, de modo que a coberta era toda ela como um campo lavrado e semeado, só falta que venha um pouco mais de chuva para que seja um bom ano agrícola. Desde que a viagem à ilha desconhecida começou que não se vê o homem do leme comer, deve ser porque está a sonhar, apenas a sonhar, e se no sonho lhe apetecesse um pedaço de pão ou uma maçã, seria um puro invento, nada mais. As raízes das árvores já estão penetrando no cavername, não tarda que estas velas içadas deixem de ser precisas, bastará que o vento sopre nas copas e vá encaminhando a caravela ao seu destino. É uma floresta que navega e se balanceia sobre as ondas, uma floresta onde, sem saber-se como, começaram a cantar pássaros, deviam estar escondidos por aí e de repente decidiram sair à luz, talvez porque a seara já esteja madura e é preciso ceifá-la. Então o homem trancou a roda do leme e desceu ao campo com a foice na mão, e foi quando tinha cortado as primeiras espigas que viu uma sombra ao lado da sua sombra. Acordou abraçado à mulher da limpeza, e ela a ele, confundidos os corpos, confundidos os beliches, que não se sabe se este é o de bombordo ou o de estibordo. Depois, mal o sol acabou de nascer, o homem e a mulher foram pintar na proa do barco, de um lado e do outro, em letras brancas, o nome que ainda faltava dar à caravela. Pela hora do meio-dia, com a maré, A Ilha Desconhecida fez-se enfim ao mar, à procura de si mesma.


José Saramago nasceu em 1922 na aldeia de Azinhaga (Golegã). Fez estudos secundários que, por dificuldades econômicas, não pôde prosseguir. Seu primeiro emprego foi o de serralheiro mecânico, tendo exercido depois, diversas outras profissões: desenhista, funcionário de saúde e de previdência social, editor, tradutor, jornalista.

Publicou o seu primeiro livro, um romance, em 1947. Colaborou como crítico literário na revista "Seara Nova". Em 1972 e 1973 fez parte da redação do jornal "Diário de Lisboa". Pertenceu à primeira direção da Associação Portuguesa de Escritores e foi, desde 1985 a 1994, presidente da Assembléia Geral da Sociedade Portuguesa de Autores. Entre Abril e Novembro de 1975 foi diretor-adjunto do jornal "Diário de Notícias". A partir de 1976 passou a viver exclusivamente do seu trabalho literário, primeiro como tradutor, depois como autor.

É Doutor Honoris Causa pelas Universidades de Turim (Itália), de Sevilha (Espanha) e de Manchester (Reino Unido); membro Honoris Causa do Conselho do Instituto de Filosofia do Direito e de Estudos Histórico-Políticos da Universidade de Pisa (Itália); membro da Academia Universal das Culturas (Paris); membro correspondente da Academia Argentina das Letras; membro do Parlamento Internacional de Escritores (Estrasburgo).

José Saramago foi laureado com o Prêmio Nobel da Literatura 1998 pela The Nobel Foundation.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

Redação Oficial

REDAÇÃO OFICIAL





É todo ato normativo e toda comunicação do Poder Público. Deve caracterizar-se pela impessoalidade, uso do padrão culto de linguagem, clareza, concisão, formalidade e uniformidade.

Outros procedimentos rotineiros também fazem parte da redação de comunicações oficiais, como as formas de tratamento e de cortesia, certos clichês de redação, a estrutura dos expedientes etc.





1. PECULIARIDADES DA REDAÇÃO OFICIAL



1.1. Impessoalidade

A redação oficial deve ser isenta da interferência da individualidade. O tratamento impessoal que deve ser dado aos assuntos que constam das comunicações oficiais decorre:

a) da ausência de impressões individuais de quem comunica;

b) da impessoalidade de quem recebe a comunicação; e

c) do caráter impessoal do próprio assunto tratado.



1.2. Linguagem

O texto oficial requer o uso do padrão culto da língua. Padrão culto é aquele em que:

a) se observam as regras da gramática formal,

b) se emprega um vocabulário comum ao conjunto dos usuários do idioma.

A obrigatoriedade do uso do padrão culto na redação oficial procede do fato de que ele está acima das diferenças lexicais, morfológicas ou sintáticas regionais, dos modismos vocabulares, das idiossincrasias lingüísticas, permitindo, por essa razão, que se atinja a pretendida compreensão por todos os cidadãos.

A linguagem técnica deve ser empregada apenas em situações que a exijam.



1.3. Formalidade

As comunicações oficiais devem ser sempre formais. Não só ao correto emprego deste ou daquele pronome de tratamento, mais do que isso, a formalidade diz respeito à polidez e à civilidade.



1.4. Padronização

A clareza de digitação, o uso de papéis uniformes e a correta diagramação do texto são indispensáveis à padronização.



1.5. Concisão

A concisão é uma qualidade do texto, principalmente o do oficial. Conciso é o texto que consegue transmitir um máximo de informações com um mínimo de palavras. A concisão é, basicamente, economia lingüística. Isso não quer dizer economia de pensamento, isto é, não se devem eliminar passagens substanciais do texto no afã de reduzi-lo em tamanho. Trata-se exclusivamente de cortar palavras inúteis, redundâncias, passagens que nada acrescentem ao que já foi dito.

Deve-se perceber a hierarquia de idéias que existe em todo texto de alguma complexidade: idéias fundamentais e idéias secundárias. Essas últimas podem esclarecer o sentido daquelas, detalhá-las, exemplificá-las; mas existem também idéias secundárias que não acrescentam informação alguma ao texto, nem têm maior relação com as fundamentais, podendo, por isso, ser dispensadas.



1.6. Clareza

A clareza deve ser a qualidade básica de todo texto oficial. Claro é aquele texto que possibilita imediata compreensão pelo leitor. A clareza não é algo que se atinja por si só: ela depende estritamente das demais características da redação oficial. Para ela concorrem:

a) a impessoalidade, que evita a duplicidade de interpretações que poderia decorrer de um tratamento personalista dado ao texto;

b) o uso do padrão culto de linguagem, em princípio, de entendimento geral e por definição avesso a vocábulos de circulação restrita, como a gíria e o jargão;

c) a formalidade e a padronização, que possibilitam a imprescindível uniformidade dos textos;

d) a concisão, que faz desaparecer do texto os excessos lingüísticos que nada lhe acrescentam.

É pela correta observação dessas características que se redige com clareza. Contribuirá, ainda, a indispensável releitura de todo texto redigido. A ocorrência, em textos oficiais, de trechos obscuros e de erros gramaticais provém principalmente da falta da releitura que torna possível sua correção.

A revisão atenta exige, necessariamente, tempo. A pressa com que são elaboradas certas comunicações quase sempre compromete sua clareza. Não se deve proceder à redação de um texto que não seja seguida por sua revisão. “Não há assuntos urgentes, há assuntos atrasados”, diz a máxima. Evite-se, pois, o atraso, com sua indesejável repercussão no redigir.





1.7. Pronomes de Tratamento

Os pronomes de tratamento apresentam certas peculiaridades. Embora se refiram à segunda pessoa gramatical (à pessoa com quem se fala, ou a quem se dirige a comunicação), levam a concordância para a terceira pessoa. É que o verbo concorda com o substantivo que integra a locução e não com o pronome. “Vossa Senhoria nomeará o substituto”; “Vossa Excelência conhece o assunto”.

Da mesma forma, os pronomes possessivos referidos a pronomes de tratamento são sempre os da terceira pessoa: “Vossa Senhoria nomeará seu substituto” (e não “Vossa ... vosso...”).

O gênero gramatical dos adjetivos referidos deve coincidir com o sexo da pessoa a que se refere, e não com o substantivo que compõe a locução. “Vossa Excelência está atarefado.”, “Vossa Senhoria deve estar satisfeito.” “Vossa Excelência está atarefada”, “Vossa Senhoria deve estar satisfeita”.

O emprego dos pronomes de tratamento obedece à secular tradição. São de uso consagrado:

Vossa Excelência, para as seguintes autoridades:



a) do Poder Executivo

Presidente da República

Vice-Presidente da República

Ministros de Estado

Governadores e Vice-Governadores de Estado e do Distrito Federal

Oficiais-Generais das Forças Armadas

Embaixadores

Secretários-Executivos de Ministérios

Secretários de Estado dos Governos Estaduais

Chefe da Casa Civil da Presidência da República

Chefe do Gabinete de Segurança Institucional

Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República

Advogado-Geral da União e o Chefe da Corregedoria-Geral da União

Prefeitos Municipais



b) do Poder Legislativo

Deputados Federais e Senadores

Ministros do Tribunal de Contas da União

Deputados Estaduais e Distritais

Conselheiros dos Tribunais de Contas Estaduais

Presidentes das Câmaras Legislativas Municipais

c) do Poder Judiciário

Ministros dos Tribunais Superiores

Membros de Tribunais

Juízes

Auditores da Justiça Militar



O vocativo a ser empregado em comunicações dirigidas aos Chefes de Poder é Excelentíssimo Senhor, seguido do cargo respectivo:

Excelentíssimo Senhor Presidente da República,

Excelentíssimo Senhor Presidente do Congresso Nacional,

Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal.



No envelope, o endereçamento das comunicações dirigidas às autoridades tratadas por Vossa Excelência, terá a seguinte forma:



À Sua Excelência o Senhor

Fulano de Tal

Ministro de Estado da Justiça

70064-900 – Brasília. DF



À Sua Excelência o Senhor

Senador Fulano de Tal

Senado Federal

70165-900 – Brasília. DF



À Sua Excelência o Senhor

Fulano de Tal

Juiz de Direito da 10a Vara Cível

Rua ABC, no 123

01010-000 – São Paulo. SP



Em comunicações oficiais, está abolido o uso do tratamento digníssimo (DD). A dignidade é pressuposto para que se ocupe qualquer cargo público, sendo desnecessária sua repetida evocação.



Vossa Senhoria é empregado para as demais autoridades e para particulares. O vocativo adequado é:

Senhor Fulano de Tal,



No envelope, deve constar do endereçamento:

Ao Senhor

Fulano de Tal

Rua ABC, no 123

12345-000 – Curitiba. PR



Fica dispensado o emprego do superlativo ilustríssimo para as autoridades que recebem o tratamento de Vossa Senhoria e para particulares. É suficiente o uso do pronome de tratamento Senhor.





Doutor não é forma de tratamento, e sim título acadêmico. Evite usá-lo indiscriminadamente. Como regra geral, empregue-o apenas em comunicações dirigidas a pessoas que tenham tal grau por terem defendido tese de doutorado. É costume designar por doutor os bacharéis, especialmente os bacharéis em Direito e em Medicina. Para quem não tem o título de doutor, o tratamento Senhor confere a desejada formalidade às comunicações.



Vossa Magnificência, empregada por força da tradição, em comunicações dirigidas a reitores de universidade. Corresponde-lhe o vocativo: Magnífico Reitor,



Os pronomes de tratamento para religiosos, de acordo com a hierarquia eclesiástica, são:

Vossa Santidade, em comunicações dirigidas ao Papa. O vocativo correspondente é: Santíssimo Padre,

Vossa Eminência ou Vossa Eminência Reverendíssima, em comunicações aos Cardeais.

Vossa Excelência Reverendíssima é usado em comunicações dirigidas a Arcebispos e Bispos.

Vossa Reverendíssima ou Vossa Senhoria Reverendíssima para Monsenhores, Cônegos e superiores religiosos.

Vossa Reverência é empregado para sacerdotes, clérigos e demais religiosos.





1.8. Fechos para Comunicações

O fecho das comunicações oficiais possui, além da finalidade óbvia de arrematar o texto, a de saudar o destinatário. Os quinze modelos que vinham sendo utilizados foram simplificados para somente dois fechos diferentes para todas as modalidades de comunicação oficial:

a) para autoridades superiores, inclusive o Presidente da República:

Respeitosamente,



b) para autoridades de mesma hierarquia ou de hierarquia inferior:

Atenciosamente,





1.9. Identificação do Signatário

Excluídas as comunicações assinadas pelo Presidente da República, todas as demais comunicações oficiais devem trazer o nome e o cargo da autoridade que as expede, abaixo do local de sua assinatura. A forma da identificação deve ser a seguinte:



(espaço para assinatura)

NOME

Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República



(espaço para assinatura)

NOME

Ministro de Estado da Justiça





Para evitar equívocos, recomenda-se não deixar a assinatura em página isolada do expediente. Transfira para essa página ao menos a última frase anterior ao fecho.







2. O PADRÃO OFÍCIO



Há dois tipos de expedientes que se diferenciam antes pela finalidade do que pela forma: o ofício e o memorando. Nos dois adota-se uma diagramação única.



2.1. Partes do documento no Padrão Ofício

O ofício e o memorando devem conter as seguintes partes:



a) tipo e número do expediente, seguido da sigla do órgão que o expede :

Exemplos:

Mem. 123/2002-MF

Of. 123/2002-MME



b) local e data em que foi assinado, por extenso, com alinhamento à direita:

Exemplo:

Brasília, 15 de março de 2007.



c) assunto: resumo do teor do documento

Exemplos:

Assunto: Produtividade do órgão em 2006.

Assunto: Necessidade de aquisição de novos computadores.



d) destinatário: o nome e o cargo da pessoa a quem é dirigida a comunicação. No caso do ofício deve ser incluído também o endereço.



e) texto: nos casos em que não for de mero encaminhamento de documentos, o expediente deve conter a seguinte estrutura:



– introdução, que se confunde com o parágrafo de abertura, na qual é apresentado o assunto que motiva a comunicação. Evite o uso das formas: “Tenho a honra de”, “Tenho o prazer de”, “Cumpre-me informar que”, empregue a forma direta;



– desenvolvimento, no qual o assunto é detalhado; se o texto contiver mais de uma idéia sobre o assunto, elas devem ser tratadas em parágrafos distintos, o que confere maior clareza à exposição;



– conclusão, em que é reafirmada ou simplesmente reapresentada a posição recomendada sobre o assunto.

Os parágrafos do texto devem ser numerados, exceto nos casos em que esses estejam organizados em itens ou títulos e subtítulos.





Já quando se tratar de mero encaminhamento de documentos a estrutura é a seguinte:



– introdução: deve iniciar com referência ao expediente que solicitou o encaminhamento. Se a remessa do documento não tiver sido solicitada, deve iniciar com a informação do motivo da comunicação, que é encaminhar, indicando a seguir os dados completos do documento encaminhado (tipo, data, origem ou signatário, e assunto de que trata), e a razão pela qual está sendo encaminhado, segundo a seguinte fórmula:



“Em resposta ao Aviso nº 12, de 1º de fevereiro de 2007, encaminho, anexa, cópia do Ofício nº 34, de 3 de abril de 2007, do Departamento Geral de Administração, que trata da requisição do servidor Fulano de Tal.”

ou

“Encaminho, para exame e pronunciamento, a anexa cópia do telegrama no 12, de 10 de fevereiro de 2007, do Presidente da Confederação Nacional de Agricultura, a respeito de projeto de modernização de técnicas agrícolas na região Nordeste.”



– desenvolvimento: se o autor da comunicação desejar fazer algum comentário a respeito do documento que encaminha, poderá acrescentar parágrafos de desenvolvimento; em caso contrário, não há parágrafos de desenvolvimento em aviso ou ofício de mero encaminhamento.



f) fecho



g) assinatura do autor da comunicação; e



h) identificação do signatário





2.2. Forma de diagramação



Os documentos do Padrão Ofício devem obedecer à seguinte forma de apresentação:



a) deve ser utilizada fonte do tipo Times New Roman de corpo 12 no texto em geral, 11 nas citações, e 10 nas notas de rodapé;



b) para símbolos não existentes na fonte Times New Roman poder-se-ão utilizar as fontes Symbol e Wingdings;



c) é obrigatório constar a partir da segunda página o número da página;



d) os ofícios, memorandos e anexos poderão ser impressos em ambas as faces do papel. Neste caso, as margens esquerda e direita terão as distâncias invertidas nas páginas pares (“margem espelho”);



e) o início de cada parágrafo do texto deve ter 2,5 cm de distância da margem esquerda;



f) o campo destinado à margem lateral esquerda terá, no mínimo, 3,0 cm de largura;



g) o campo destinado à margem lateral direita terá 1,5 cm;



h) deve ser utilizado espaçamento simples entre as linhas e de 6 pontos após cada parágrafo, ou, se o editor de texto utilizado não comportar tal recurso, de uma linha em branco;



i) não deve haver abuso no uso de negrito, itálico, sublinhado, letras maiúsculas, sombreado, sombra, relevo, bordas ou qualquer outra forma de formatação que afete a elegância e a sobriedade do documento;



j) a impressão dos textos deve ser feita na cor preta em papel branco. A impressão colorida deve ser usada apenas para gráficos e ilustrações;



l) todos os tipos de documentos do Padrão Ofício devem ser impressos em papel de tamanho A-4, ou seja, 29,7 x 21,0 cm;

n) dentro do possível, todos os documentos elaborados devem ter o arquivo de texto preservado para consulta posterior ou aproveitamento de trechos para casos análogos;



o) para facilitar a localização, os nomes dos arquivos devem ser formados da seguinte maneira: tipo do documento + número do documento + palavras-chave do conteúdo

Ex.: “Of. 123 - relatório produtividade ano 2006”





2.3. Ofício



Definição e Finalidade

Ofício é a comunicação que é expedida exclusivamente para tratar assuntos oficiais entre órgãos da Administração Pública ou a particulares.



Forma e Estrutura

Quanto à sua forma, o ofício segue o modelo do padrão ofício, com acréscimo do vocativo, que invoca o destinatário, seguido de vírgula.

Exemplos:

Excelentíssimo Senhor Presidente da República

Senhora Ministra

Senhor Chefe de Gabinete

Devem constar do cabeçalho ou do rodapé do ofício as seguintes informações do remetente:

– nome do órgão ou setor;

– endereço postal;

– telefone e endereço de correio eletrônico.



2.4. Memorando



Definição e Finalidade

O memorando é a modalidade de comunicação entre unidades administrativas de um mesmo órgão, que podem estar hierarquicamente em mesmo nível ou em níveis diferentes. Trata-se, portanto, de uma forma de comunicação eminentemente interna.

Sua característica principal é a agilidade. A tramitação do memorando em qualquer órgão deve pautar-se pela rapidez e pela simplicidade de procedimentos burocráticos. Para evitar desnecessário aumento do número de comunicações, os despachos ao memorando devem ser dados no próprio documento e, no caso de falta de espaço, em folha de continuação.



Forma e Estrutura

Quanto à sua forma, o memorando segue o modelo do padrão ofício, com a diferença de que o seu destinatário deve ser mencionado pelo cargo que ocupa.

Exemplos:

Ao Sr. Chefe do Departamento de Administração

Ao Sr. Subchefe para Assuntos Jurídicos



2.5. Correio Eletrônico



Definição e finalidade

O correio eletrônico (“e-mail”), por seu baixo custo e celeridade, transformou-se na principal forma de comunicação para transmissão de documentos.



Forma e Estrutura

Um dos atrativos de comunicação por correio eletrônico é sua flexibilidade. Assim, não interessa definir forma rígida para sua estrutura. Entretanto, deve-se evitar o uso de linguagem incompatível com uma comunicação oficial.



O campo assunto do formulário de correio eletrônico deve ser preenchido de modo a facilitar a organização documental tanto do destinatário quanto do remetente.



A mensagem que encaminha algum arquivo deve trazer informações mínimas sobre seu conteúdo.



Sempre que disponível, deve-se utilizar recurso de confirmação de leitura. Caso não seja disponível, deve constar pedido de confirmação de recebimento.



Valor documental

Nos termos da legislação em vigor, para que a mensagem de correio eletrônico tenha valor documental, isto é, para que possa ser aceita como documento original, é necessário existir certificação digital que ateste a identidade do remetente, na forma estabelecida em lei.







3. DIFICULDADES DA NORMA CULTA





3.1. Ortografia



A correção da grafia é requisito elementar de qualquer texto, e ainda mais importante quando se trata de textos oficiais. Muitas vezes, uma simples troca de letras pode alterar não só o sentido da palavra, mas de toda uma frase.

Com relação aos erros de grafia, pode-se dizer que são de dois tipos: os que decorrem do emprego inadequado de determinada letra por desconhecimento de como escrever uma palavra, e aqueles causados por lapso de digitação.

Assim, toda revisão que se faça em determinado documento ou expediente deve sempre levar em conta a correta escrita.



Errado: Ele trabalhou como adido de embaixada.

Certo: Ele trabalhou como adido à embaixada.



Errado: Ele vai torcer para o clube do irmão.

Certo: Ele vai torcer pelo clube do irmão.



Errado: Vultuosa quantia foi gasta na campanha daquele vereador.

Certo: Vultosa quantia foi gasta na campanha daquele vereador.



Errado: A estadia do deputado no Rio de Janeiro será breve.

Certo: A estada do deputado no Rio de Janeiro será breve.



Errado: Se eu ver o deputado, falarei com ele.

Certo: Se eu vir o deputado, falarei com ele.



Errado: Quero falar consigo.

Certo: Quero falar com você/com o senhor.





Errado: Este texto foi desclassificado porque está inteligível.

Certo: Este texto foi desclassificado porque está ininteligível.



Errado: Não tenho qualquer vínculo com meus ex-chefes.

Certo: Não tenho nenhum vínculo com meus ex-chefes.



Errado: Ao meu ver, essas crianças precisam de mais carinho e amor.

Certo: A meu ver, essas crianças precisam de mais carinho e amor.



Errado: Ele passou muito rápido e desapercebido por todos nós.

Certo: Ele passou muito rápido e despercebido por todos nós.



Errado: Por que você não troca seu candidato? Ao invés de votar em Mário, vote em Valter.

Certo: Por que você não troca seu candidato? Em vez de votar em Mário, vote em Valter.



Errado: Os que desejarem maiores informações deverão se encaminhar à sala da coordenação.

Certo: Os que desejarem melhores / mais informações deverão se encaminhar à sala da coordenação.



Errado: Pediu-me que o ajudasse a descriminar as despesas.

Certo: Pediu-me que o ajudasse a discriminar as despesas.





3.2. SINTAXE



É a parte da Gramática que estuda a palavra em relação às outras, que com ela se unem para exprimir o pensamento. É a parte mais importante da Gramática, porque contribui de modo fundamental para a clareza da exposição e para a ordenação do pensamento.

Os problemas mais freqüentemente encontrados na construção de frases dizem respeito à má pontuação, à ambigüidade da idéia expressa, à elaboração de falsos paralelismos, erros de comparação etc. Decorrem, em geral, do desconhecimento da ordem das palavras na frase. A seguir, citam-se alguns desses deslizes muito recorrentes na construção de frases, registrados em documentos oficiais.





3.2.1. Problemas com o Sujeito

O sujeito é o ser de quem se fala ou que executa a ação enunciada na oração. Ele pode ter complemento, mas não ser complemento. Devem ser evitadas, portanto, construções como:

Errado: É tempo do Congresso votar a emenda.

Certo: É tempo de o Congresso votar a emenda.



Errado: Apesar das relações entre os países estarem cortadas, (...).

Certo: Apesar de as relações entre os países estarem cortadas, (...).



Errado: Não vejo mal no Governo proceder assim.

Certo: Não vejo mal em o Governo proceder assim.



Errado: Antes destes requisitos serem cumpridos, (...).

Certo: Antes de estes requisitos serem cumpridos, (...).



Errado: Apesar da Assessoria ter informado em tempo, (...).

Certo: Apesar de a Assessoria ter informado em tempo, (...).





3.2.2. Frases Fragmentadas

A fragmentação de frases “consiste em pontuar uma oração subordinada ou uma simples locução como se fosse uma frase completa”. Embora seja usada como recurso estilístico na literatura, a fragmentação de frases devem ser evitada nos textos oficiais, pois muitas vezes dificulta a compreensão. Ex.:



Errado: O programa recebeu a aprovação do Congresso Nacional. Depois de ser longamente debatido.

Certo: O programa recebeu a aprovação do Congresso Nacional, depois de ser longamente debatido.

Certo: Depois de ser longamente debatido, o programa recebeu a aprovação do Congresso Nacional.



Errado: O projeto de Convenção foi oportunamente submetido ao Presidente da República, que o aprovou. Consultadas as áreas envolvidas na elaboração do texto legal.

Certo: O projeto de Convenção foi oportunamente submetido ao Presidente da República, que o aprovou, consultadas as áreas envolvidas na elaboração do texto legal.









3.2.3. Erros de Paralelismo

Uma das convenções estabelecidas na linguagem escrita “consiste em apresentar idéias similares numa forma gramatical idêntica”, o que se chama de paralelismo. Assim, incorre-se em erro ao conferir forma não paralela a elementos paralelos.



Errado: Pelo aviso circular recomendou-se aos Ministérios economizar energia e que elaborassem planos de redução de despesas.

Certo: Pelo aviso circular, recomendou-se aos Ministérios que economizassem energia e (que) elaborassem planos para redução de despesas.

Certo: Pelo aviso circular, recomendou-se aos Ministérios economizar energia e elaborar planos para redução de despesas.



Errado: No discurso de posse, mostrou determinação, não ser inseguro, inteligência e ter ambição.

Certo: No discurso de posse, mostrou determinação, segurança, inteligência e ambição.

Certo: No discurso de posse, mostrou ser determinado e seguro, ter inteligência e ambição.



Errado: O Presidente visitou Paris, Bonn, Roma e o Papa.

Certo: O Presidente visitou Paris, Bonn e Roma. Nesta última capital, encontrou-se com o Papa.



Errado: O projeto tem mais de cem páginas e muita complexidade.

Certo: O projeto tem mais de cem páginas e é muito complexo.

Certo: O projeto é muito extenso e complexo.



Errado: Ou Vossa Senhoria apresenta o projeto, ou uma alternativa.

Certo: Vossa Senhoria ou apresenta o projeto, ou propõe uma alternativa.



Errado: O interventor não só tem obrigação de apurar a fraude como também a de punir os culpados.

Certo: O interventor tem obrigação não só de apurar a fraude, como também de punir os culpados.



Errado: O novo procurador é jurista renomado, e que tem sólida formação acadêmica.

Certo: O novo procurador é jurista renomado e tem sólida formação acadêmica.

Certo: O novo procurador é jurista renomado, que tem sólida formação acadêmica.





3.2.4. Erros de Comparação

A omissão de certos termos, ao se fazer a comparação – omissão própria da língua falada – deve ser evitada na língua escrita, pois compromete a clareza do texto: nem sempre é possível identificar, pelo contexto, qual o termo omitido.



Errado: O salário de um professor é mais baixo do que um médico.

Certo: O salário de um professor é mais baixo do que o salário de um médico.

Certo: O salário de um professor é mais baixo do que o de um médico.



Errado: O alcance do Decreto é diferente da Portaria.

Certo: O alcance do Decreto é diferente do alcance da Portaria.

Certo: O alcance do Decreto é diferente do da Portaria.



Errado: O Ministério da Educação dispõe de mais verbas do que os Ministérios do Governo.

Certo: O Ministério da Educação dispõe de mais verbas do que os outros Ministérios do Governo.

Certo: O Ministério da Educação dispõe de mais verbas do que os demais Ministérios do Governo.





3.2.5. Ambigüidade

Ambígua é a frase ou oração que pode ser tomada em mais de um sentido. Como a clareza é requisito básico de todo texto oficial, deve-se atentar para as construções que possam gerar equívocos de compreensão.



Ambíguo: O Ministro comunicou a seu secretariado que ele seria exonerado.

Claro: O Ministro comunicou exoneração dele a seu secretariado.

Claro: O Ministro comunicou a seu secretariado a exoneração desse.



Ambíguo: O Deputado saudou o Presidente da República, em seu discurso, e solicitou sua intervenção no seu Estado, mas isso não o surpreendeu.

Claro: Em seu discurso o Deputado saudou o Presidente da República. No pronunciamento, solicitou a intervenção federal em seu Estado, o que não surpreendeu o Presidente da República.



Ambíguo: Roubaram a mesa do gabinete em que eu costumava trabalhar.

Claro: Roubaram a mesa do gabinete no qual eu costumava trabalhar.

Claro: Roubaram a mesa do gabinete na qual eu costumava trabalhar.



Ambíguo: Sendo indisciplinado, o Chefe admoestou o funcionário.

Claro: O Chefe admoestou o funcionário por ser esse indisciplinado.





3.2.6. Concordância

A concordância é o processo sintático segundo o qual certas palavras se acomodam, na sua forma, às palavras de que dependem.



Errado: Se houverem dúvidas favor perguntar.

Certo: Se houver dúvidas favor perguntar.



Errado: Já fazem dez dias que esta Casa Legislativa encontra-se em recesso.

Certo: Já faz dez dias que esta Casa Legislativa encontra-se em recesso.



Errado: Fazem cinco meses que a PF iniciou a apuração de irregularidades.

Certo: Faz cinco meses que a PF iniciou a apuração de irregularidades.



Errado: Vão fazer cinco anos que ingressei no Serviço Público.

Certo: Vai fazer cinco anos que ingressei no Serviço Público.



Errado: Depois das últimas chuvas, podem haver centenas de desabrigados.

Certo: Depois das últimas chuvas, pode haver centenas de desabrigados.



Errado: Devem haver soluções urgentes para estes problemas.

Certo: Deve haver soluções urgentes para estes problemas.



Errado: Aconteceu, naquela época, fatos terríveis.

Certo: Aconteceram, naquela época, fatos terríveis.



Errado: Vossas Excelências apoiastes a decisão.

Certo: Vossas Excelências apoiaram a decisão.



Errado: Ainda não chegou os documentos comprobatórios.

Certo: Ainda não chegaram os documentos comprobatórios.



Errado: Podemos passar-lhe bastante informações sobre o caso.

Certo: Podemos passar-lhe bastantes informações sobre o caso.



Errado: Se houver dificuldades, qualquer que sejam, avise-nos.

Certo: Se houver dificuldades, quaisquer que sejam, avise-nos.



Errado: Obedeceram-se aos severos regulamentos.

Certo: Obedeceu-se aos severos regulamentos.



Errado: Tratavam-se de questões fundamentais.

Certo: Tratava-se de questões fundamentais.



Errado: Discutiu-se na semana passada os acordos que têm de ser assinados nos próximos dias.

Certo: Discutiram-se na semana passada os acordos que têm de ser assinados nos próximos dias.





3.2.7. Pontuação

Os sinais de pontuação, ligados à estrutura sintática, têm as seguintes finalidades:

a) assinalar as pausas e as inflexões da voz (a entoação) na leitura;

b) separar palavras, expressões e orações que, segundo o autor, devem merecer destaque;

c) esclarecer o sentido da frase, eliminando ambigüidades.





No clube que freqüentamos, há um mês houve um incêndio.

No clube que freqüentamos há um mês, houve um incêndio.



O carro estava percorrendo a estrada solitária, à noite.

O carro estava percorrendo a estrada, solitária à noite.



Ele foi criticado, quando lutava pelos amigos.

Ele foi criticado, quando lutava, pelos amigos.



A frase a seguir pode ter seu sentido alterado apenas com a colocação da vírgula.



“Se o homem soubesse o valor que tem a mulher andaria se rastejando à sua procura.”



Constitui erro crasso usar a vírgula entre termos que mantêm entre si estreita ligação sintática – p. ex., entre sujeito e verbo, entre verbos ou nomes e seus complementos.



Errado: O Presidente da República, indicou, sua posição no assunto.

Certo: O Presidente da República indicou sua posição no assunto.



Errado: O deputado assistiu, ao pronunciamento do Presidente, em Fortaleza.

Certo: O deputado assistiu ao pronunciamento do Presidente em Fortaleza.







3.2.8. SEMÂNTICA



A semântica estuda o sentido das palavras, expressões, frases e unidades maiores da comunicação verbal, os significados que lhe são atribuídos.

Deve-se verificar sempre o contexto em que as palavras estão sendo utilizadas e procurar sinônimos, ou termos mais precisos para as palavras repetidas.

A redação oficial não pode alhear-se às transformações lingüísticas – produto da dinâmica social – nem incorporá-las acriticamente. As novidades vocabulares devem sempre ser usadas com critério, evitando-se aquelas que podem ser substituídas por vocábulos já de uso consolidado sem prejuízo do sentido que se lhes quer dar.

Não se concebe que, em nome de suposto purismo, a linguagem das comunicações oficiais fique imune a empréstimos de outras línguas. O importante é usar o estrangeirismo de forma consciente, buscar o equivalente português quando houver, ou conformar a palavra estrangeira ao espírito da língua portuguesa.





Expressões a Evitar e Expressões de

Uso Recomendável



A linguagem dos textos oficiais deve sempre pautar-se pelo padrão culto formal da língua. Não é aceitável, portanto, que desses textos constem coloquialismos ou expressões de uso restrito a determinados grupos, que comprometeriam sua própria compreensão pelo público.

Quanto a determinadas expressões que devem ser evitadas, mencionem-se aquelas que formam cacófatos, ou seja, “o encontro de sílabas em que a malícia descobre um novo termo com sentido torpe ou ridículo”.

A seguir há uma lista de expressões cujo uso ou repetição deve ser evitado, indicando com que sentido devem ser empregadas e sugerindo alternativas vocabulares a palavras que costumam constar com excesso dos expedientes oficiais.



à medida que / na medida em que

À medida que (locução proporcional) – à proporção que, ao passo que, conforme: Os preços deveriam diminuir à medida que diminui a procura.

Na medida em que (locução causal) – pelo fato de que, uma vez que: Na medida em que se esgotaram as possibilidades de negociação, o projeto foi integralmente vetado.

Evite os cruzamentos – bisonhos, canhestros – *à medida em que, *na medida que...



a partir de

A partir de deve ser empregado preferencialmente no sentido temporal: A cobrança do imposto entra em vigor a partir do início do próximo ano.

Evite repeti-la com o sentido de ‘com base em’, preferindo considerando, tomando-se por base, fundando-se em, baseando-se em.



assim

Use após a apresentação de alguma situação ou proposta para ligá-la à idéia seguinte. Alterne com: dessa forma, desse modo, diante do exposto, diante disso, conseqüentemente, portanto, por conseguinte, assim sendo, em conseqüência, em vista disso, em face disso.



através de / por intermédio de

Através de quer dizer de lado a lado, por entre: A viagem incluía deslocamentos através de boa parte da floresta.

Evite o emprego com o sentido de meio ou instrumento; nesse caso empregue por intermédio, por, mediante, por meio de, segundo, servindo-se de, valendo-se de:

O projeto foi apresentado por intermédio do Departamento.

O assunto deve ser regulado por meio de decreto.

A comissão foi criada mediante portaria do Ministro de Estado.



bem como

Evite repetir; alterne com e, como (também), igualmente, da mesma forma. Evite o uso, polêmico para certos autores, da locução bem assim como equivalente.



causar

Evite repetir. Use também originar, motivar, provocar, produzir, gerar, levar a, criar.



constatar

Evite repetir. Alterne com atestar, apurar, averiguar, certificar-se, comprovar, evidenciar, observar, notar, perceber, registrar, verificar.



dado / visto / haja vista

Os particípios dado e visto têm valor passivo e concordam em gênero e número com o substantivo a que se referem:

Dados o interesse e o esforço demonstrados, optou-se pela permanência do servidor em sua função.

Dadas as circunstâncias...

Vistas as provas apresentadas, não houve mais hesitação no encaminhamento do inquérito.

Já a expressão haja vista, com o sentido de uma vez que ou seja considerado, veja-se, é invariável:

O servidor tem qualidades, haja vista o interesse e o esforço demonstrados.



de forma que, de modo que/de forma a, de modo a

De forma (ou maneira, modo) que nas orações desenvolvidas: Deu amplas explicações, de forma que tudo ficou claro.

De forma (maneira ou modo) a nas orações reduzidas de infinitivo: Deu amplas explicações, de forma (maneira ou modo) a deixar tudo claro. São descabidas na língua escrita as pluralizações orais vulgares *de formas (maneiras ou modos) que...



detalhar

Evite repetir; alterne com particularizar, pormenorizar, delinear, minudenciar.



devido a

Evite repetir; utilize igualmente em virtude de, por causa de, em razão de, graças a, provocado por.





dirigir

Quando empregado com o sentido de encaminhar, alterne com transmitir, mandar, encaminhar, remeter, enviar, endereçar.



em face de

Sempre que a expressão em face de equivaler a diante de, é preferível a regência com a preposição de; evite, portanto, face a, frente a.



enquanto

Conjunção proporcional equivalente a ao passo que, à medida que. Evitar a construção coloquial enquanto que.



especialmente

Use também principalmente, mormente, notadamente, sobretudo, nomeadamente, em especial, em particular.





inclusive

Advérbio que indica inclusão; opõe-se a exclusive. Evite-se o seu abuso com o sentido de ‘até’; nesse caso utilize o próprio até ou ainda, igualmente, mesmo, também, ademais.



informar

Alterne com comunicar, avisar, noticiar, participar, inteirar, cientificar, instruir, confirmar, levar ao conhecimento, dar conhecimento; ou perguntar, interrogar, inquirir, indagar.



no sentido de

Empregue também com vistas a, a fim de, com o fito (objetivo, intuito, fim) de, com a finalidade de, tendo em vista ou mira, tendo por fim.



onde

Como pronome relativo significa em que (lugar): A cidade onde nasceu. O país onde viveu. Evite, pois, construções como “a lei onde é fixada a pena” ou “o encontro onde o assunto foi tratado”.

Nesses casos, substitua onde por em que, na qual, no qual, nas quais, nos quais.

O correto é, portanto: a lei na qual é fixada a pena, o encontro no qual (em que) o assunto foi tratado.



operacionalizar

Neologismo verbal de que se tem abusado. Prefira realizar, fazer, executar, levar a cabo ou a efeito, praticar, cumprir, desempenhar, produzir, efetuar, construir, compor, estabelecer.



posição / posicionamento

Posição pode ser alterado com postura, ponto de vista, atitude, maneira, modo. Posicionamento significa ‘disposição, arranjo’, e não deve ser confundido com posição.



relativo a

Empregue também referente a, concernente a, tocante a, atinente a, pertencente a, que diz respeito a, que trata de, que respeita.



ressaltar

Varie com destacar, sublinhar, salientar, relevar, distinguir, sobressair.



tratar (de)

Empregue também contemplar, discutir, debater, discorrer, cuidar, versar, referir-se, ocupar-se de.

domingo, 30 de maio de 2010

ADJETIVO

Adjetivo

Adjetivo é a classe gramatical que modifica um substantivo, atribuindo-lhe qualidade, estado ou modo de ser.

Um adjetivo normalmente exerce uma dentre três funções sintáticas na oração: Aposto explicativo, adjunto adnominal ou predicativo.

Os adjetivos podem ser

Adjetivo explicativo

É o adjetivo que denota qualidade essencial do ser, qualidade inerente, ou seja, qualidade que não pode ser retirada do substantivo. Por exemplo, todo homem é mortal, todo fogo é quente, todo leite é branco, então mortal, quente e branco são adjetivos explicativos, em relação a homem, fogo e leite.

Adjetivo restritivo

É o adjetivo que denota qualidade adicionada ao ser, ou seja, qualidade que pode ser retirada do substantivo. Por exemplo, nem todo homem é inteligente, nem todo fogo é alto, nem todo leite é enriquecido, então inteligente, alto e enriquecido são adjetivos restritivos, em relação a homem,




fogo e leite.

Obs.: Sempre que o adjetivo estiver imediatamente após o substantivo qualificado por ele, teremos o seguinte: Se ele for adjetivo explicativo, deverá estar entre vírgulas e funcionará sintaticamente como aposto explicativo; se for adjetivo restritivo, não poderá estar entre vírgulas e funcionará como adjunto adnominal.

Por exemplo: O homem, mortal, age como um ser imortal. Nessa frase, mortal é adjetivo explicativo, pois indica uma qualidade essencial do substantivo, por isso está entre vírgulas e sua função sintática é a de aposto explicativo.

Já na frase O homem inteligente lê mais. inteligente é adjetivo restritivo, pois indica uma qualidade adicionada ao substantivo, por isso não está entre vírgulas e sua função sintática é a de adjunto adnominal.

Perceba que inteligente, apesar de não ser essencial a todos os homens, é especificamente ao universo
de homens dos quais estamos falando. Caso o adjetivo restritivo esteja entre vírgulas, funcionará como
predicativo. Por exemplo: O diretor, preocupado, atendeu ao telefone.

Perceba que preocupado não é uma qualidade essencial a todos os homens nem o é ao diretor de quem estamos falando; o diretor possui a qualidade de preocupado apenas em um determinado momento - essa é a diferença entre o adjunto adnominal e o predicativo.

Orações Subordinadas Adjetivas

As orações subordinadas adjetivas são aquelas que funcionam como um adjetivo, modificando o substantivo. Sempre são iniciadas por um pronome relativo e podem ser denominadas de explicativas e de restritivas, tais quais os adjetivos.

Oração Subordinada Adjetiva Explicativa

É a oração que funciona como o adjetivo explicativo, ou seja, denota uma qualidade essencial do substantivo, deve estar entre vírgulas e funciona como aposto explicativo. Por exemplo: O homem, que é mortal, age como um ser imortal.

Há outra oração que funciona como aposto explicativo: a oração subordinada substantiva apositiva . A diferença é que esta não explica o significado do substantivo anterior, mas sim o contexto da frase anterior. Por exemplo, a frase Todos temos conhecimento de uma verdade: que o Brasil é o maior país da América do Sul. possui uma oração subordinada substantiva apositiva (que o Brasil é o maior país da América do Sul), que explica o contexto da frase anterior, e não o significado da palavra verdade.

Oração Subordinada Adjetiva Restritiva

É a oração que funciona como o adjetivo restritivo, ou seja, denota uma qualidade adicionada ao substantivo, não pode estar entre vírgulas e funciona como adjunto adnominal. Por exemplo: O homem que é inteligente lê mais. O nome restritivo se deve ao fato de que a oração restringe o significado do substantivo anterior, ou seja, a oração apresentada significa que apenas os homens que são inteligentes lêem mais, os outros não. É assim que se comprova a existência de uma oração subordinada adjetiva restritiva: usando a expressão somente... ,os outros não.



Adjetivo Pátrio

É o adjetivo que Indica a nacionalidade ou o lugar de origem do ser. Observe alguns deles:

Estados e cidades brasileiros:

Acre = acreano Alagoas = alagoano Amapá = amapaense
Aracaju = aracajuano ou aracajuense Amazonas = amazonense ou baré Belém (PA) = belenense
Belo Horizonte = belo-horizontino
Boa Vista = boa-vistense




Brasília = brasiliense
Cabo Frio = cabo-friense
Campinas = campineiro ou campinense
Curitiba = curitibano
Espírito Santo = espírito-santense ou capixaba
Fernando de Noronha = noronhense Florianópolis = florianopolitano Fortaleza = fortalense
Goiânia = goianiense
João Pessoa = pessoense
Macapá = macapaense
Maceió = maceioense Manaus = manauense Maranhão = maranhense Marajó = marajoara
Natal = natalense ou papa-jerimum
Porto Alegre = porto-alegrense
Porto Velho = porto-velhense
Ribeirão Preto = ribeiropretense
Rio de Janeiro (estado) = fluminense
Rio de Janeiro (cidade) = carioca
Rio Branco = rio-branquense
Rio Grande do Norte = rio-grandense-do-norte, norte-rio-grandense ou potiguar Rio Grande do Sul = rio-grandense-do-sul, sul-rio-grandense ou gaúcho. Rondônia = rondoniano
Roraima = roraimense
Salvador (BA) = salvadorense ou soteropolitano
Santa Catarina = catarinense, catarineta ou barriga-verde
Santarém = santarense
São Paulo (estado) = paulista
São Paulo (cidade) = paulistano
Sergipe = sergipano Teresina = teresinense Tocantins = tocantinense

Países

Croácia = croata
Costa Rica= costa-riquense
Curdistão = curdo
Estados Unidos = estadunidense, norte-americano ou ianque. El Salvador = salvadorenho
Guatemala = guatemalteco
Índia = indiano ou hindu (os que professam o hinduísmo) Irã = iraniano
Israel = israelense ou israelita Moçambique = moçambicano Mongólia = mongol ou mongólico
Panamá = panamenho
Porto Rico = porto-riquenho
Somália = somali

Adjetivos pátrios compostos

Na formação de adjetivos pátrios compostos, o primeiro elemento aparece na forma reduzida e, normalmente, erudita. Observe alguns exemplos:

África = afro- / Cultura afro-americana
Alemanha = germano- ou teuto- / Competições teuto-inglesas
América = américo- / Companhia américo-africana
Ásia = ásio- / Encontros ásio-europeus
Áustria = austro- / Peças austro-búlgaras
Bélgica = belgo- / Acampamentos belgo-franceses
China = sino- / Acordos sino-japoneses
Espanha = hispano- / Mercado hispano-português
Europa = euro- / Negociações euro-americanas
França = franco- ou galo- / Reuniões franco-italianas




Grécia = greco- / Filmes greco-romanos Índia = indo- / Guerras indo-paquistanesas Inglaterra = anglo- / Letras anglo-portuguesas Itália = ítalo- / Sociedade ítalo-portuguesa Japão = nipo- / Associações nipo-brasileiras Portugal = luso- / Acordos luso-brasileiros

Locução Adjetiva

Em muitos casos, prefere-se usar, no lugar de um adjetivo, uma expressão formada por mais de uma palavra para caracterizar o substantivo. Essa expressão, que tem o mesmo valor e o mesmo sentido de um adjetivo, recebe o nome de locução adjetiva. Observe alguns exemplos:


de águia = aquilino de aluno = discente de anjo = angelical de ano = anual
de aranha = aracnídeo
de asno = asinino
de baço = esplênico de bispo = episcopal de bode = hircino
de boi = bovino
de bronze = brônzeo ou êneo
de cabelo = capilar
de cabra = caprino
de campo = campestre ou rural
de cão = canino
de carneiro = arietino
de cavalo = cavalar, eqüino, eqüídio ou hípico
de chumbo = plúmbeo
de chuva = pluvial
de cinza = cinéreo
de coelho = cunicular
de cobre = cúprico
de couro = coriáceo de criança = pueril de dedo = digital
de diamante = diamantino ou adamantino
de elefante = elefantino
de enxofre = sulfúrico
de esmeralda = esmeraldino
de estômago = estomacal ou gástrico
de falcão = falconídeo
de farinha = farináceo
de fera = ferino
de ferro = férreo
de fígado = figadal ou hepático
de fogo = ígneo
de gafanhoto = acrídeo de garganta = gutural de gelo = glacial
de gesso = gípseo
de guerra = bélico
de homem = viril ou humano
de ilha = insular
de intestino = celíaco ou entérico de inverno = hibernal ou invernal de lago = lacustre
de laringe = laríngeo
de leão = leonino
de lebre = leporino
de lobo = lupino
de lua = lunar ou selênico
de macaco = simiesco, símio ou macacal
de madeira = lígneo
de marfim = ebúrneo ou ebóreo

de mestre = magistral
de monge = monacal
de neve = níveo ou nival
de nuca = occipital
de orelha = auricular
de ouro = áureo
de ovelha = ovino
de paixão = passional
de pâncreas = pancreático
de pato = anserino
de peixe = písceo ou ictíaco
de pombo = columbino
de porco = suíno ou porcino
de prata = argênteo ou argírico
dos quadris = ciático
de raposa = vulpino
de rio = fluvial
de serpente = viperino
de sonho = onírico
de terra = telúrico, terrestre ou terreno
de trigo = tritício
de urso = ursino
de vaca = vacum de velho = senil de vento = eólico de verão = estival
de vidro = vítreo ou hialino
de virilha = inguinal
de visão = óptico ou ótico




Flexões do Adjetivo

Gênero e Número

O adjetivo concorda com o substantivo a que se refere em gênero e número (masculino e feminino; singular e plural). Caso o adjetivo seja representado por um substantivo, ficará invariável, ou seja, se a palavra que estiver qualificando um elemento for, originalmente, um substantivo, ela manterá sua forma primitiva e passará a ser denominado de substantivo adjetivado. Por exemplo, a palavra cinza é originalmente um substantivo, porém, se estiver qualificando um elemento, funcionará como adjetivo. Ficará, então invariável. Camisas cinza, ternos cinza.


Ex.


Carros amarelos e motos vinho. Telhados marrons e paredes musgo. Espetáculos gigantescos e comícios monstro.


Adjetivo composto

Com raras exceções, o adjetivo composto tem seus elementos ligados por hífen. Apenas o último elemento concorda com o substantivo a que se refere; os demais ficam na forma masculina, singular. Caso um dos elementos que formam o adjetivo composto seja um substantivo adjetivado, todo o adjetivo composto ficará invariável. Por exemplo, a palavra rosa é originalmente um substantivo, porém, se estiver qualificando um elemento, funcionará como adjetivo. Caso se ligue a outra palavra por hífen, formará um adjetivo composto; como é um substantivo adjetivado, o adjetivo composto inteiro ficará invariável. Camisas rosa-claro. Ternos rosa-claro.


Ex.


Olhos verde-claros.
Calças azul-escuras e camisas verde-mar. Telhados marrom-café e paredes verde-claras.


Azul-marinho, azul-celeste, ultravioleta e qualquer adjetivo composto iniciado por cor-de-... são sempre invariáveis.

Os adjetivos compostos surdo-mudo e pele-vermelha têm os dois elementos flexionados.


Graus do Adjetivo

Comparativo

compara uma qualidade entre dois elementos ou duas qualidade de um mesmo elemento. São três os comparativos:
de superioridade: Para alguns alunos, Português é mais fácil que Química.
de igualdade: Para alguns alunos, Português é tão fácil quanto Química.
de inferioridade: Para alguns alunos, Português é menos fácil que Química.
Bom, mau, grande e pequeno têm formas sintéticas (melhor, pior, maior e menor), porém, em comparações feitas entre duas qualidades de um mesmo elemento, devem-se usar as formas
analíticas mais bom, mais mau, mais grande e mais pequeno. Por exemplo, Pedro é maior do que
Paulo, pois está-se fazendo a comparação de dois elementos, mas Pedro é mais grande que pequeno, pois está-se fazendo a comparação de duas qualidades de um mesmo elemento.
Ex. Edmundo foi condenado, mas tenho certeza de que ele é mais bom do que mau.
Joaquim é mais bom do que esperto.

Superlativo

Engrandece a qualidade de um elemento. São dois os superlativos de um adjetivo:

Superlativo absoluto

analítico = o adjetivo é modificado por um advérbio: Ex. Carla é muito inteligente.
sintético = quando há o acréscimo de um sufixo (-íssimo, -érrimo, -ílimo)
Ex. Carla é inteligentíssima.

Superlativos absolutos sintéticos eruditos



Alguns adjetivos no grau superlativo absoluto sintético apresentam a primitiva forma latina, daí serem chamados de eruditos. Por exemplo, o adjetivo magro possui dois superlativos absolutos sintéticos: o normal, magríssimo, e o erudito, macérrimo.

Eis uma pequena lista de superlativos absolutos sintéticos:

benéfico = beneficentíssimo bom = boníssimo ou ótimo célebre = celebérrimo comum = comuníssimo
cruel = crudelíssimo difícil = dificílimo doce = dulcíssimo
fácil = facílimo fiel = fidelíssimo frágil = fragílimo
frio = friíssimo ou frigidíssimo
humilde = humílimo jovem = juveníssimo livre = libérrimo
magnífico = magnificentíssimo magro = macérrimo ou magríssimo manso = mansuetíssimo
mau = péssimo nobre = nobilíssimo pequeno = mínimo
pobre = paupérrimo ou pobríssimo
preguiçoso = pigérrimo próspero = prospérrimo sábio = sapientíssimos
agrado = sacratíssimo

Superlativo relativo

de superioridade = Enaltece a qualidade do substantivo como "o mais" dentre todos os outros. Ex. Carla é a mais inteligente.
sintético = Enaltece a qualidade do substantivo como "o menos" dentre todos os outros. Ex. Carla é a menos inteligente.


Exercícios

1- "(...) No fundo o imponente castelo. No primeiro plano a íngreme ladeira que conduz ao castelo. Descendo a ladeira numa disparada louca o fogoso ginete.
Montado no ginete o apaixonado caçula do castelão inimigo de capacete prateado com plumas brancas. E
atravessada no ginete a formosa donzela desmaiada entregando ao vento os cabelos cor de carambola." (A. de Alcântara Machado, Carmela).
“(...) íamos, se não me engano, pela rua das Mangueiras, quando voltando-nos, vimos um carro elegante
que levavam a trote largo dois fogosos cavalos. Uma encantadora menina, sentada ao lado de uma senhora idosa, se recostava preguiçosamente sobre o macio estofo e deixava pender pela cobertura
derreada do carro a mão pequena que brincava com um leque de penas escarlates." José de Alencar, Lucíola).

Nesses excertos, observa-se que a maioria dos substantivos são modificados por adjetivos ou expressões equivalentes.
Comparando os dois textos:
a) aponte em cada um deles o efeito produzido por tal recurso lingüístico b) justifique sua resposta.

2- "Os homens são os melhores fregueses" - os melhores encontra-se no grau:
a) comparativo de superioridade.
b) superlativo relativo de superioridade. c) superlativo absoluto sintético.
d) superlativo absoluto analítico de superioridade.

3- O desagradável da questão era vê-lo de mau humor depois da troca de turno. Na frase acima, as palavras destacadas comportam-se, respectivamente, como:


a) substantivo, adjetivo, substantivo. b) adjetivo, advérbio, verbo.
c) substantivo, adjetivo, verbo.
d) substantivo, advérbio, substantivo. e) adjetivo, adjetivo, verbo.

4- Em algumas gramáticas, o adjetivo vem definido como sendo “a palavra que modifica o substantivo". Assinale a alternativa em que o adjetivo destacado contraria a definição.
a) Li um livro lindo.
b) Beber água é saudável. c) Cerveja gelada faz mal.
d) Gente fina é outra coisa!
e) Ele parece uma pessoa simpática.

5- Indique a alternativa em que não é atribuída a idéia de superlativo ao adjetivo. a) É uma idéia agradabilíssima.
b) Era um rapaz alto, alto, alto.
c) Saí de Iá hipersatisfeito.
d) Almocei tremendamente bem.
e) É uma moça assustadoramente alta.

6- Siga o modelo: modificação da paisagem – modificação paisagística
a) água da chuva
b) exageros da paixão
c) atitudes de criança
d) soro contra veneno de serpente

7- Dê o superlativo absoluto sintético de:
a) feliz b) livre

8- Faça conforme o modelo: alma de fora – alma exterior
a) imagem do espelho
b) parede de vidro
c) imposição da lei
d) comprimento da linha

9- Dê os adjetivos equivalentes às expressões em destaque. a) programa da tarde
b) ciclo da vida
c) representante dos alunos

10- Passe para o plural. a) borboleta azul-clara
b) borboleta cor-de-laranja

11- Dadas as afirmações de que os adjetivos correspondentes aos substantivos:
1. enxofre
2. chumbo
3. prata
São, respectivamente,
1. sulfúreo 2. plúmbeo 3. argênteo Verificamos que está (estão) correta(s): a) apenas a afirmação 1 .
b) apenas a afirmação 2. c) apenas a afirmação 3.
d) apenas as afirmações 1 e 2.
e) todas as afirmações.

12- Relacione a primeira coluna à segunda. (1) água ( ) pluvial
(2) chuva ( ) ebúrneo
(3) gato ( ) felino
(4) marfim ( ) aquilino
(5) prata ( ) argênteo
(6) rio
(7) não consta da lista
A seqüência correta é:
a) 7, 7, 3, 1,;7.


b) 6, 3, 7, 1,4. c) 2, 4, 3, 7, 5. d) 2, 4, 7, 1, 7.

13- Os superlativos absolutos sintéticos de comum, soberbo, fiel, miúdo são, respectivamente:
a) comuníssimo, super, fielísimo, minúsculo. b)comuníssimo, sobérrimo, fidelíssimo, minúsculo.
c) comuníssimo, superbíssimo, fidelíssimo, minutíssimo. d) comunérrimo, sobérrimo, fidelíssimo, miudérrimo.
e) comunérrimo, sobérrimo, fielíssimo, minutissimo.

14- Os adjetivos Iígneo, gípseo, níveo, braquial significam, respectivamente:
a) lenhoso, feito de gesso, alvo, relativo ao braço.
b) lenhoso, feito de gesso, nivelado, relativo ao crânio. c) lenhoso, rotativo, abalizado, relativo ao crânio.
d) associado, rotativo, nivelado, relativo ao braço.
e) associado, feito de gesso, abalizado, relativo ao crânio.

15- Aponte a alternativa incorreta quanto à correspondência entre a locução e o adjetivo. a) glacial (de gelo); ósseo (de osso)
b) fraternal (de irmão); argênteo (de prata)
c) farináceo (de farinha); pétreo (de pedra)
d) viperino (de vespa); ocular (de olho)
e) ebúrneo (de marfim); insípida (sem sabor)

16- O plural de terno azul-claro, terno verde-mar é, respectivamente:
a) ternos azuis-claros, ternos verdes-mares. b) ternos azuis-claros, ternos verde-mares.
c) ternos azul-claro, ternos verde-mar.
d) ternos azul-claros, ternos verde-mar. e) ternos azuis-claro, ternos verde-mar.

17- Marque:
a) se I e II forem verdadeiras b) se I e III forem verdadeiras
c) se II e III forem verdadeiras
d) se todas forem verdadeiras e) se todas forem falsas
"... eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor..."
I. No primeiro caso, autor é substantivo; defunto é adjetivo. II. No segundo caso, defunto é substantivo; autor é adjetivo.
III. Em ambos os casos, tem-se um substantivo composto.

18- Assinale a alternativa em que o termo cego(s) é um adjetivo.
a) "Os cegos, habitantes de um mundo esquemático, sabem aonde ir..."
b) "O cego de Ipanema representava naquele momento todas as alegorias da noite escura da alma..." c) "Todos os cálculos do cego se desfaziam na turbulência do álcool."
d) "Naquele instante era só um pobre cego."
e) "... da Terra que é um globo cego girando no caos."

19- Observe as proposições abaixo:
O1.Poucos autores escrevem poemas herói-cômicos.
02. Os cabelos castanhos-escuros emolduravam-lhe o semblante juvenil.
04. Vestidos vermelhos e amarelo-laranja foram os mais vendidos na exposição.
08. As crianças surdo-mudas foram encaminhadas à clinica para tratamento.
16. Discutiu-se muito a respeito de ciências político-sociais na última assembléia dos professores.
32. As sociedades luso-brasileira adquiriram novos livros de autores portugueses. Marque as frases corretas e some os valores que lhes são atribuídos.

20- O adjetivo está mal flexionado em grau em:
a) livre: libérrimo
b) magro: macérrimo c) doce: docílimo
d) triste: tristíssimo
e) fácil: facílimo

21- Sigao exemplo:
Não chame a torre de alta, mas de altíssima. Não considero sua atitude nobre, mas (*).



22- No trecho "... o homem não fala simplesmente uma língua, não a usa, como mero instrumento de comunicação...", o termo sublinhado é um:
a) substantivo e significa "simples".
b) advérbio e significa "genuíno". c) adjetivo e significa "quase".
d) advérbio e significa ''estreme".
e) adjetivo e significa "puro".

23- Assinale a alternativa em que ambos os adjetivos não se flexionam em gênero. a) elemento motor, tratamento médico-dentário
b) esforço vão, pasçeio matinal
c) juiz arrogante, sentimento fraterno d) cientista hindu, homem célebre
e) costume andaluz, manual Iúdico-instrutivo

24- Das frases abaixo, apenas uma apresenta adjetivo no comparativo de superioridade, assinale-a. a) A palmeira é a mais alta árvore deste lugar.
b) Guardei as melhores recordações daquele dia, c) A Lua é menor do que a Terra.
d) Ele é o maior aluno de sua turma.
e) O mais alegre dentre os colegas era Ricardo.

25- Dê o grau normal dos superlativos:
a) macérrimo b) tetérrimo
c) minutíssimo
d) personalíssimo e) feracíssimo

26- Relativamente à concordância dos adjetivos compostos indicativos de cor, uma, dentre as seguintes alternativas, está errada. Qual?
a) saia amarelo-ouro b) papel amarelo-ouro
c) caixa vermelho-sangue d) caixa vermelha-sangue e) caixas vermelho-sangue

RESPOSTAS

1. a) Por se tratar de textos narrativos, a adjetivação tem caráter descritivo e não argumentativo. E ambos os textos, nota-se uma caracterização enaltecedora, que desenha um quadro idealizado cujos elementos se aproximam da perfeição. No segundo texto, essa construção é o objetivo do escritor; no primeiro, o escritor faz referência a certo tipo de escrito em que os elementos apresentados são sempre os mesmos – sempre idealizados, sempre caracterizado pelos mesmos adjetivos.
b) Deve-se notar o uso dos artigos definidos no primeiro texto que substantivam as expressões a que se referem – não é um castelo, é o “imponente castelo” das típicas histórias românticas. Esse
tratamento permite perceber que o primeiro texto é metalinguístico.


2. b
3. a
4. b
5. d
6. a) pluvial b)passionais
c) infantis, pueris
d) antiofídico
7. a) felicíssimo b) libérrimo
8. a) especular b) vítrea
c) legal d) linear
9. a) vespertino
b) vital
c) discente
10. a) borboletas azul-claras
b) Borboletas cor-de-laranja
11. e

12. c
13. c
14. a
15. d
16. d
17. a
18. e
19. 01+04+16=21
20. c
21. nobilíssima
22. e
23. d
24. c
25. a) magro
b) tetro (tétrico)
c) miúdo d) pessoal
e) feraz ( fértil, fecundo)
26. d